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12-01-2013        Jornal de Notícias

Como é do domínio público, o relatório do FMI – que propõe inqualificável degradação da segurança social, da saúde e da proteção social, regressão no sistema de educação, mais desemprego, redução de salários, aumento dos horários de trabalho e fragilização da defesa e da segurança – foi encomendado pelo governo.

A encomenda foi feita com o objetivo de ser instrumento do governo no desencadear daquilo que designa de “redefinição das funções do Estado” e no “corte adicional” de 4000 milhões de euros na despesa.

Pelo processo da sua produção e, acima de tudo, pelo seu conteúdo, tal relatório deve ser classificado de ignóbil. Ele só tem interesse num aspeto: tornou mais claro, perante os portugueses, a malvadez, o retrocesso social e civilizacional das políticas deste governo e, logo, a certeza de que elas negam o futuro do país.

Como muito bem expressou neste jornal Silva Peneda, este relatório “não vale nada. É um disparate”.

Jamais se pode permitir o entretenimento da sociedade em torno da validade ou não validade do que esses parasitas funcionários do FMI – municiados por Gaspar, Moedas e outros governantes e assessores mercenários – desavergonhadamente nos propõem. O “trabalho” desenvolvido nas últimas décadas, pela maior parte dos diretores e “especialistas” do FMI, é hoje confirmadamente a causa da imensa miséria em vários países africanos, da América Latina e outros.

Que sociedade nos propõe estes indivíduos? Por exemplo, a nova dose de desemprego direto que recomendam significa tão-somente despedir os nossos professores, médicos e enfermeiros, os nossos especialistas e trabalhadores de várias áreas que nos garantem acesso à saúde, à educação, à segurança, à justiça, a uma vida com direitos fundamentais.

Existem portugueses sérios e competentes, de várias formações ideológicas e técnicas, capazes de analisar a situação do país nos diversos setores e de produzirem propostas sustentadas para debate da sociedade. Não é nisso que o governo aposta, porque este não é, comprovadamente, um governo para resolver os problemas do país. Por isso deve ser demitido e substituído.

Passos Coelho e Cª, com todo o cinismo e desonestidade política, consideram agora que já têm, sob capa tecnocrática, quem represente o papel de mau da fita. O passo seguinte é encenarem uma discussão sobre a matéria, de preferência com a participação de figurões do centrão político, aliás já anunciada para o Palácio Foz. E engajar o mais possível o Partido Socialista. E nesta etapa os perigos continuam a ser muitos, pois há gente que há muito vendeu a alma ao diabo e está sempre disponível para “minorar” a dimensão da dose. Mesmo quando é inquestionável que o neoliberalismo e o neoconservadorismo dominantes querem destruir o que se vai designando por Estado Social.

Os desafios são grandes para quem, nos diversos espaços políticos, quer defender o Estado Social e encontrar caminhos alternativos para o país. Quem se coloca deste lado sabe que parte em desvantagem: estão impregnadas na sociedade cargas ideológicas muito fortes que condicionam todo o debate.

O Memorando e as políticas feitas em seu nome inculcaram a ideia de um conjunto de inevitabilidades, de opções mentirosas, designadas de inevitáveis, que limitam os recursos para o Estado Social, quer porque determinam a economia e impedem o crescimento, quer porque canalizam toda a riqueza que se consegue produzir e juntar para servir os credores, os agiotas e os grandes acionistas de grupos económicos protegidos. Quando Vítor Gaspar afirma que “está em causa o Estado Social que os portugueses querem ter e o que querem pagar”, afirmação profundamente ideológica, ele parte do pressuposto que todas as opções políticas já assumidas pelo governo serão inamovíveis.

À esquerda impõe-se então um amplo debate, aberto e participado pelos democratas dos diversos quadrantes, que discuta a Despesa Pública e o Estado Social a sério, não debaixo daquelas falsas premissas.

Este episódio do relatório do FMI veio colocar em evidência que só será possível e viável discutir seriamente o Estado Social no contexto da formulação de políticas e de governação alternativas.


 
 
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Manuel Carvalho da Silva



 
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