As políticas de anúncio, de repetição de promessas que tardam em se concretizar ou se esvaziam pelo caminho, esgotam-se sempre em pouco tempo. Num contexto como aquele que vivemos, carregado de ruturas na vida das pessoas, de desproteções, de sofrimento, de urgências que clamam políticas com rigor e ação, esse esgotamento acelera-se e torna-se perigoso.
São múltiplos os casos, no plano nacional e na União Europeia, em que entre o anúncio e a concretização se verifica um desfasamento abissal. Onde deveria haver agilidade e rapidez há meses a passar. Onde todos deviam estar abrangidos, não faltam exclusões. Onde precisávamos de recursos volumosos, há mãos cheias de muito pouco. Assim, a desconfiança, a incerteza, o desespero e o medo crescem e gera-se um quadro cada vez mais propício ao cinismo político e à manipulação.
A “bazuca” europeia, tão festejada pelo volume e rapidez com que foi anunciada, afinal não começou a chegar em 2020 e já se diz que talvez venham uns “pacotes de vitaminas” lá para o outono. E não nos admiremos se a coisa resvalar para 2022. A receita milagrosa pode, assim, reduzir-se a mezinhas.
É uma tolice política apresentar a “bazuca” como o meio que vem garantir combate eficaz à desproteção e à pobreza, acudir à recomposição da economia, propiciar “reformas estruturais”, alavancar um processo de transformação do país. Quanto à exaltação do poder da “bazuca, as posições da Direita até ultrapassam as do governo. Mesmo que (por milagre) a UE adote uma política financeira adequada à dimensão e caraterísticas desta crise que vivemos - reforçando imenso o apoio a países como Portugal -, nós só sairemos do pântano em que estamos se abandonarmos os austeritarismos tacanhos, se dotarmos o Estado de meios e operacionalidade, se fizermos forte investimento público, se qualificarmos e valorizarmos o emprego, se tratarmos da coesão entre gerações e territórios.
Os problemas também não se resolvem com fugas para a frente ou excesso de expectativa na ciência, como fez, esta semana, a Presidente da Comissão Europeia ao transferir a esperança para as vacinas de segunda geração, quando aquilo que podia dar mais confiança, agora, era uma boa gestão do processo de vacinação. Ora, o da União está a ser um relativo fiasco. Os avanços científicos na área da saúde são importantíssimos, mas exige-se convocar muitos outros saberes humanos - científicos e não científicos - com princípios e valores éticos, para se evitar cenários aterradores. Desde logo, deite-se mão da ciência da boa execução das políticas.
O governo não pode anunciar apoios que depois não aparecem ou se estreitam; não pode anunciar disponibilização de computadores que, entretanto, não compra. O ministro Sisa Vieira ao anunciar que a tarifa social da Internet será disponibilizada até junho, lá longe do reinício das aulas presenciais, abre espaço à ridicularização.
Esta falta de agilidade em tempo real é, em parte, filha de incertezas que hoje pairam sobre quem governa, mas acima de tudo, de uma conceção política que sacraliza o desinvestimento e a ortodoxia orçamental. Umas palavras de anúncio e a desmemória cultivada por certa comunicação social e pelo ciclo (e circo) noticioso, não substituem uma governação com ética e rigor, geradora de confiança.