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18-05-2013        Jornal de Notícias

A destruição de atividades económicas e da Administração Pública, a recessão, o desemprego, a existência de um sistema fiscal que agrava as desigualdades, o aumento dos horários de trabalho, a diminuição dos salários e das pensões, dos direitos laborais e sociais, o empobrecimento, têm como efeitos inevitáveis: a redução da intensidade da democracia; a perda de soberania e de independência do país; uma dinâmica de mobilidade social descendente.

O ataque ao Estado social, aos direitos fundamentais do trabalho, à contratação coletiva, ao próprio direito do trabalho, colocando-o na mão do patrão para utilização unilateral como instrumento de gestão, fazem parte desse processo.

O que o Governo recentemente acertou com a troika foi uma nova e violenta dose de austeridade, achincalhando a utilidade do emprego público e agredindo a geração mais velha, como se as reformas fossem privilégios.

Este caminho de desastre não se trava nem inverte com pequenos acertos nas formas de prosseguir a austeridade irracional, ou com a patranha de que é só mais um esforçozito porque vem aí a salvação do país na nossa ida aos mercados. Só existirá saída dos bloqueios em que nos encontramos com políticas alternativas, outro Governo, outra composição da Assembleia da República.

O presidente da República, pela cobertura que dá às atuais políticas e ao Governo, pelas invocações sacrílegas de Nossa Senhora de Fátima e outros disparates, tornou-se problema nacional. Tendo em consideração a sua importância como instituição, tem de ser crescentemente responsabilizado.

Quando se analisam as últimas eleições gregas, observamos que os partidos que haviam de se coligar no atual Governo (a alternância à grega) se apresentaram ao eleitorado com a proposta de renegociar o memorando com a troika. O que aconteceu depois é conhecido: endurecimento das condições do "resgate", mais cortes e mais impostos, a par de um ligeiro alívio das condições de pagamento da dívida. Mas, como a dívida é impagável, a Grécia não para de se afundar na recessão com a dívida sempre a crescer. E não há sinal de que as políticas europeias se transformem a tempo de evitar os piores cenários para Portugal.

Quando entre nós se perfilam alternâncias que propõem aplicações suaves do memorando e combinações de austeridade e crescimento, possíveis em frases redondas, mas impossíveis na prática, devemos ter presente essa experiência.

As alternâncias que tivemos nas últimas décadas em Portugal criaram vícios e graves promiscuidades. E geraram um centrão de interesses que vai ter de ser instabilizado para o país ter futuro.

É premente a construção de uma base programática de alternativa à austeridade, que conte com a participação de democratas de diversos quadrantes e imprescindivelmente com as propostas e a responsabilização das forças sociais e políticas de esquerda.

É preciso informar e falar verdade aos portugueses e mobilizá-los. Em simultâneo, fazer alianças com outros povos em situação semelhante à nossa. Uma alternativa vencedora exige a denúncia do memorando, renegociação da dívida, se necessário suspendendo os pagamentos durante a negociação, resistência a chantagens, preparação de todos os cenários, mesmo o de uma hipotética saída do euro.

Temos de elaborar uma estratégia de defesa do Estado social, priorizar a criação de emprego nas propostas de revitalização das atividades económicas e do tipo de desenvolvimento que queremos, estancar o empobrecimento, ganhar a juventude para o combate pelo futuro do país, assumir a defesa da soberania e o compromisso com as leis e a Constituição da República, apresentar à sociedade um modelo e uma perspetiva de governo futuro que mereçam a confiança dos portugueses.

Estes denominadores comuns são possíveis e poderão ser partilhados por largos setores da sociedade portuguesa. Há que trabalhá-los com força à esquerda, vencendo enquistamentos existentes, sem esconder diferenças ou ignorar responsabilidades. O sofrimento do povo e a destruição do país em curso exigem articulação de propostas e de ação, entre velhos e novos atores sociais e políticos que se batem pelos valores da democracia, da solidariedade, do progresso.


 
 
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Manuel Carvalho da Silva