Em tempo de nova visita da troica, somos bombardeados pela ideia de que vai ser preciso escolher entre mais tempo ou mais austeridade, e que quem vai escolher não somos nós nem o governo, mas sim a própria troica. A escolha resumem-na assim: se a troica for benevolente e bem agradecida ao “bom aluno” escolherá mais tempo, se for cruel escolherá mais austeridade.
Este bombardeamento é devastador, é deprimente, é vergonhoso!
O leque de alternativas de escolha não se reduz a mais tempo ou mais austeridade e quem tem de fazer opções não é a troica, é Portugal. Num país independente e soberano, a governação não é externa. São as suas instituições e o seu povo que determinam os rumos e as opções.
Mais austeridade não nos fará sair da crise, não é alternativa!
É possível substituir mais austeridade por mais tempo?
Se mais tempo significar também mais austeridade, jamais essa via é solução. Precisamos de mais tempo sim, mas se a mais tempo estiverem associadas condições de investimento e de criação de emprego. Ora, as políticas seguidas não disponibilizam dinheiro para investir e assentam no aumento do desemprego.
Por outro lado, um fechar de olhos da troica a um défice superior a 4,5% agora, pode vir acompanhado pela imposição, para o próximo ano, de uma redução de 5,5% ou 6% para 3%, o que implicará mais austeridade, outro incumprimento do memorando em 2013, logo, novo alargamento do prazo com nova dose de austeridade…
A austeridade empobrece e quanto mais se empobrece menos possível se torna pagar dívidas. Para pagar dívidas é preciso, no mínimo, que os portugueses tenham um trabalho produtivo e um salário digno (emprego) e nós estamos a ficar ou desempregados, ou com piores empregos.
Entretanto, a ideia de que o dinheiro escasseia é tão falsa como a de que é possível pagar dívidas empobrecendo.
Há quem atualmente empreste dinheiro a países da eurozona a taxas de juro negativas, na esperança de que o euro se desfaça e o dinheiro aplicado em títulos alemães ou franceses se multiplique com a valorização dos novos marcos ou francos. Não há dinheiro para os países da periferia como Portugal, mas poderia haver se fossem criados os tais eurobonds de que tanto se fala, programas de investimento europeu para implementar em tempo útil.
Por que razão a austeridade não é igual para todos os cidadãos e os credores são isentados dela? Então não é verdade que os grandes acionistas dos bancos engordaram com o regabofe conhecido que deu origem à crise?
Não se devem fazer pedidos à troica, mas é preciso dizer, com voz e força coletivas, aos mandantes europeus e nacionais, que há soluções. Não devemos e não aceitamos continuar a empobrecer. É preciso suspender o serviço da dívida tal como está, libertando recursos para a criação de emprego e riqueza. Vamos resistir e mobilizar forças que conduzam a um entendimento novo com os credores quanto aos termos da reestruturação da dívida. São escolhas de riscos e desafios, mas não haverá saídas sem os correr.
Sacuda-se a teoria de que quem está fraco se sujeita e nada mais. Os portugueses, que alcançaram grandes vitórias ao longo da História e fizeram revoluções, serão capazes de, com informação, decisão e ação, optar pelas escolhas difíceis.
Arrepiam-nos as afirmações subservientes de alguns conselheiros de serviço que dizem, “a troica deve ter em conta que estamos a cumprir” e “nos comportamos melhor que os gregos ou os espanhóis”. Que caridade esperar de instituições e pessoas cujos objetivos fundamentais são assegurar que a especulação financeira sugue a economia real, como tão bem denunciou em El País de 14.08, Juan J. Millás.
Na II Guerra Mundial, enquanto a generalidade dos povos europeus sofria os horrores do fascismo, Salazar e seus acólitos, impondo-nos um regime fascista que havia de durar até 1974, exaltavam o comportamento humilde e submisso dos portugueses e vangloriavam-se de uma “neutralidade” fantoche.
São, pois, execráveis os apelos à subjugação e ao adormecimento do povo.