Centro de Estudos Sociais
sala de imprensa do CES
RSS Canal CES
twitter CES
facebook CES
youtube CES
17-08-2024        Jornal de Notícias

No passado dia 19 de julho assistimos àquele que foi considerado o maior apagão cibernético observado até hoje. Essa classificação resultou da sua escala global, da sua profundidade na instabilização do funcionamento de milhares e milhares de empresas, dos seus efeitos na vida real das pessoas, obrigadas a manipular instrumentos invisíveis para cumprir as tarefas do dia a dia, no trabalho e fora dele.

O acontecimento e seus impactos foram profusamente analisados logo no dia. Ficamos avisados de que desastres idênticos, ou mais graves, podem acontecer. Houve especialistas que o consideraram um “desastre natural dentro do ciberespaço” - esperemos que os apagões deste tipo não passem a fazer parte da lista de acidentes naturais. Outros identificaram hipóteses de desastres idênticos com origens não equacionadas até agora. Ninguém descartou a possibilidade de surgirem atos de pirataria que podem causar bloqueios da mesma dimensão.

A conclusão sobre o que aconteceu foi-se formando rápido e resume-se no seguinte: no início do dia 19 de julho, que em função do fuso horário começa “do outro lado do mundo”, aconteceu um erro na atualização do software Falcon pertencente à empresa americana de cibersegurança, a CrowdStrike, parceira estratégica da Microsoft. Conclusão, houve falha, logo existiu má gestão nas operações da atualização.

Não foram feitos os testes prévios necessários? Foi excesso de confiança em tecnologias de ponta e em procedimentos com inteligência artificial, num quadro onde o que se prioriza é a redução de custos? Estará a haver reflexão e tomada de medidas em silêncio, para serem mais eficazes? O poder político, em todas as suas escalas, passa a olhar para estes problemas com a enorme importância que eles têm, ou submete-se?

Muito rapidamente o assunto eclipsou-se e ficou a sensação de que os seres humanos vivem submetidos a uma cadeia de responsabilidade difusa, que dilui nexos dessa mesma responsabilidade, resultando daí uma sujeição crescente dos mais frágeis a tudo o que são impactos negativos. Estas enormes empresas são poderosíssimas, mas não podem ser inimputáveis. Elas constituem-se hoje como os grandes veículos de concentração de riqueza, geram lucros astronómicos. Têm de investir mais na precaução de falhas, e de responsabilizar-se pelos riscos que geram.

Os cidadãos, por mais atentos e bem preparados que estejam, jamais terão capacidade e meios para se protegerem de desastres como este de 19 de julho. A generalidade das empresas também não. Do “funcionamento do mercado” não virão respostas. São os estados e as instituições de regulação, nacionais e internacionais, que têm de assumir a sua centralidade, na criação e imposição de medidas preventivas e de mecanismos de reparação, que deverá ser suportada, em primeiro lugar, por quem gera os problemas.


 
 
pessoas
Manuel Carvalho da Silva



 
temas
cibernética    economia    tecnologia