Quando falamos de desenvolvimento, devemos sempre acrescentar: económico e social. Todavia, talvez seja mais profundo e intrínseco à sociedade humana, e a todas as expressões do seu desenvolvimento, falarmos de desenvolvimento socioeconómico. As opções económicas, bem como as relações de poder que as determinam, são sempre escolhas políticas da sociedade, através dos sistemas de governação instituídos e das decisões dos governantes em cada tempo concreto.
O viés económico não pode continuar a exercer domínio avassalador sobre as mais diversas esferas e temas da sociedade - do climático e ambiental à formação e qualificação das pessoas, passando pelo trabalho, emprego e proteção social, pelas migrações e muitos outros. O que se pode fazer para que se evidenciem os distintos interesses existentes, se concerte o que deve ser concertado e se travem as injustiças, a pobreza e as desigualdades?
Na Comissão Permanente de Concertação Social (CPCS), vão trabalhar-se respostas objetivas aos grandes problemas sociais, ou prosseguirá o vazio de afirmações generalistas sobre crescimento, competitividade e produtividade? A CPCS tem sido governamentalizada ao sabor de taticismos das agendas governamentais, ou até como arma de arremesso contra o Parlamento, quando isso convém a poderes dominantes. Por outro lado, os acordos aí alcançados, em regra, não são sujeitos a avaliação. Este Governo vai corrigir essas práticas manipuladoras?
Observando o programa do Governo e declarações da ministra do Trabalho e do primeiro-ministro, não se vislumbram respostas positivas. Nada aponta para um sério questionamento do perfil de especialização da nossa economia que vai de mal a pior. Afirmações feitas sobre o desemprego e a segurança social, a secundarização estratégica dos efeitos da precariedade, a abordagem da imigração numa perspetiva meramente economicista, a persistência na oferta de umas migalhas na fiscalidade em substituição de aumentos salariais reais acabarão por desequilibrar ainda mais a relação entre o trabalho, o emprego e a proteção social e por travar o desenvolvimento socioeconómico.
A necessidade da valorização das profissões e qualificações e medidas contra o bloqueio no acesso à habitação tornaram-se dois problemas cruciais, em particular para os jovens. O Governo e os patrões vão colocá-los, de facto, na agenda da Concertação?
Não é possível ir concertando o social sem contratação coletiva e um sistema de relações de trabalho estruturado e a funcionar. Ora, cada vez mais, os quadros de direitos e deveres dos trabalhadores, das regras para a organização e prestação do trabalho, são estabelecidos unilateralmente pelas entidades patronais e não pela negociação entre os atores desse sistema. Quanto à contratação, um “Estudo sobre a negociação coletiva em 1999 e 2019”, disponibilizado esta semana pelo Centro de Relações Laborais (a merecer atenta análise), mostra-nos uma perigosa diminuição da negociação coletiva setorial e uma pobre evolução qualitativa dos conteúdos contratuais. As práticas vão em sentido contrário ao das medidas a adotar para termos contratos coletivos de progresso.
Há que ampliar a luta por uma mais justa distribuição da riqueza e contra as desigualdades e a pobreza. Colocando o ser humano sempre acima do lucro.