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11-06-2024        Jornal de Notícias

No passado dia 25 de maio, estive presente, por compromisso familiar, na Alameda da Universidade de Lisboa, na cerimónia da bênção das fitas presidida pelo senhor patriarca de Lisboa, cardeal Rui Valério. Assisti, também, à queima das fitas na Faculdade de Belas Artes. As muitas horas passadas nas duas cerimónias levaram-me a reter conteúdos das mensagens transmitidas e a observar simbologias que persistem (ou emergem) na Universidade.

É gratificante ver milhares e milhares de famílias com níveis de vida muito modestos a viverem, com evidente felicidade, estas cerimónias. Em inúmeros casos, é o dia em que se festeja a existência do primeiro licenciado na família. Felizmente, a Universidade já não é só para minorias privilegiadas. Entretanto, desapareceu a velha relação entre o canudo e o emprego, e a vida com que a esmagadora maioria destes jovens vai deparar será dura. Naquelas cerimónias estas realidades estão muito distantes e há simbologias e atos carregados de alienação.

No ano letivo de 2022/2023 estiveram inscritos, no total das instituições do Ensino Superior (universidades e politécnicos), 446 028 alunos, e concluíram estudos quase 90 mil. No total de pessoas empregadas em 2023, tínhamos 32,5% com Ensino Superior, quando em 1998 eram apenas 8,9%. O maior impulso estruturante para o desenvolvimento do país e para uma vida melhor é o avanço, quantitativo e qualitativo, na formação escolar. E, as qualificações escolares são sempre uma mais-valia e base indispensável para as qualificações profissionais.

O diferencial de ganho médio de quem concluiu o Ensino Superior, comparado com o ganho do conjunto da população empregada no setor privado, embora venha a decrescer, é ainda (em 2022) de mais cerca de 52%. Todavia, se o baixo perfil de especialização da economia persistir, se não se capacitar e modernizar a Administração Pública e se continuarem as baixíssimas condições de trabalho e de vida oferecidas aos jovens, é negado este farol do futuro.

Ao terminar a cerimónia da bênção das fitas, o patriarca de Lisboa incentivou os jovens a continuarem a festa e afirmou: “que seja a festa da esperança, da transformação do mundo. Sede os produtores de paz, de partilha, de solidariedade. Que Lisboa seja a cidade da fraternidade, onde não há pobres, não há excluídos, não há sem-abrigo, mas há homens” plenos e dignos. Diremos que são objetivos de chegada acertados. Só que faltou uma boa identificação e estratégia para eliminar as assimetrias na partida.

Durante a cerimónia imperou uma mensagem assente numa espiritualidade religiosa bastante dissociada da vida concreta. Ora, a pessoa humana é um todo pleno, onde a espiritualidade (religiosa ou não) se integra para ajudar a criar e transformar. Estes jovens vão deparar-se com falta de emprego qualificado, com precariedade e propostas de baixos salários, com impossibilidade de acesso à habitação. Muitos vão sentir a necessidade de emigrar, distanciando-se da família - instituição que a Igreja Católica tanto releva. Era preciso um apelo forte à responsabilização, de cada um e de todos, na construção de vontades e de organização e ação coletivas.

Sejamos capazes de criar condições para que os jovens sonhem e transformem este mundo de crescentes injustiças e perigos.


 
 
pessoas
Manuel Carvalho da Silva



 
temas
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