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25-05-2024        Jornal de Notícias

Sobre estudos relativos a qualquer matéria costuma dizer-se, com a-propósito: quando se compara o que não é comparável, desagua-se na manipulação. Vem isto a propósito de uma sugestão/desafio feita por Luís Marques Mendes ao Governo, para que este proceda a uma reforma do Estado, focada na Administração Pública Central. Este comentador é useiro e vezeiro em lançar temas para debate, em forma pretensamente descomprometida, mas sempre ao serviço da agenda política da Direita. Fê-lo, mais uma vez, no seu espaço de comentário (sem contraditório), na SIC, no passado domingo.

Para fundamentar a sua sugestão socorreu-se de dados, a que pomposamente chamou “estudo”, insinuando cientificidade nos seus comentários. Quem são os autores do “estudo” e onde foi publicado? Qual a metodologia empregue?

Marques Mendes fez apenas uma comparação simplista sobre o número de entidades públicas na Administração Central em três países com população idêntica: Portugal, 10,4 milhões; Bélgica 11,7; e Suécia 10,5. Acontece que a Bélgica, que tem um território de 1/3 de Portugal, é um Estado Federado e muito regionalizado, com 3 níveis de administração. Quanto à Suécia, onde 29% do total do emprego é público (na Bélgica é 18% e em Portugal apenas 15%) tem um território 5 vezes o nosso, mas dispõe de uma grande descentralização para os seus 21 condados.

Um estudo comparativo sério sobre a dimensão, a organização e a eficácia da Administração Pública dos estados exige análise sobre, nomeadamente: o quadro de desenvolvimento de cada país em apreciação; o tipo de Estado - se é ou não Federal, se tem ou não regionalização e os seus níveis de descentralização; a densidade populacional e a forma como a população é mais ou menos concentrada; a identificação quantitativa mas também qualitativa das instituições ou serviços existentes; as formas como está organizada a prestação dos direitos fundamentais às pessoas.

Precisamos de reestruturar áreas e serviços da Administração Pública (AP)? Sim, sem dúvida! Sucessivos governos foram despindo o Estado de organismos com capacidade de reflexão estratégica e de análise crítica, para entregar essas cruciais missões a entidades privadas. Para não provocarem alarido muitas vezes optaram por manter as “velhas” instituições - direções gerais, laboratórios, institutos, fundações, departamentos - só que depauperadas, logo incapazes de cumprir bem as suas missões.

Um debate sério sobre a reestruturação da Administração Pública deve ter por focos: i) a qualidade e complexidade da prestação dos serviços às pessoas; ii) a sua capacitação e rejuvenescimento, hoje exaurida em várias áreas; iii) a valorização de profissões, carreiras e salários, para que o emprego público seja atrativo; iv) a garantia de investimento em tecnologia avançada na AP.

Fazendo um exercício de memória vemos que, já em 2012, Paulo Portas apresentou o cardápio da Direita, para a reestruturação do Estado, orientado para dois objetivos: primeiro, justificar as políticas austeritárias sobre os portugueses e sobre os trabalhadores da AP em particular; segundo, acelerar a privatização da prestação de serviços que o Estado tem de assegurar. O resto foi propaganda enganosa. A manipulação de Marques Mendes não passa, pois, de exercício recorrente. 


 
 
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Manuel Carvalho da Silva



 
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