Todos os dias nos noticiários – mais recentemente a propósito dos combates pelo clima ou de vertentes da luta feminista – o ativismo é uma prática positiva e crucial da cidadania. No sentido filosófico, o termo aplica-se a uma doutrina ou argumentação que privilegia a transformação da realidade em detrimento de uma abordagem que seja sobretudo especulativa. Já no plano mais objetivamente político, usa-se como sinónimo de protesto continuado ou de militância dedicada em prol de causas ou de combates de interesse e impacto públicos. Por vezes em condições de ultrapassar ou de complementar a mais formal e programática atividade partidária.
Nas democracias representativas o ativismo é uma atividade destinada a superar as suas limitações, assumindo caraterísticas de participação em regra mais pragmáticas, transversais e próximas das comunidades. Funciona, além disso, como expressão avançada e informal de combates que, num plano estritamente legal, demorariam bastante mais tempo e jamais teriam a mesma força, vibração e espontaneidade. Estas dependem do seu modo próprio de operar – panfletos e petições, marchas e manifestações, boicotes e greves, pressão sobre a comunicação social e iniciativas dramatizadas, hoje ainda o uso metódico e imaginativo das redes sociais –, mas igualmente da enérgica e constante entrega pessoal de quem o assume.
Apesar de ter também lugar no campo da extrema-direita, muitos dos combates mais justos e progressistas do mundo atual devem a vitalidade e muitas conquistas e inovações à intervenção, por vezes pioneira e sempre ousada, da militância ativista. De campanhas na área do trabalho que o sindicalismo oficial não preenche a combates pela autonomia das nações e das minorias oprimidas, passando pela oposição ao racismo e à xenofobia, pelas lutas das mulheres e pelos feminismos, pela ação contra o assédio sexual e laboral, pelos direitos LGBTQ+, pelas iniciativas pelo clima ou pelo acesso à morte assistida. Todavia, volta-se contra si própria ao pactuar com o sectarismo.
O termo vem do latim sectariu, aplicado a todo o seguidor de uma seita, demonstrando devoção exagerada por um ponto de vista, crença ou ideologia e traduzida numa perspetiva estreita e rígida. Certos ativistas adotam esta atitude, assumindo posições obstinadas expressas em modalidades de ódio, preconceito e cancelamento dirigidos a pessoas e grupos que não pensam precisamente como eles. As razões são múltiplas, e passam pelo infantilismo político, por uma psicologia individual ou de grupo autocentrada ou por um quadro doutrinário ortodoxo e simplista, tomando frequentemente a forma de ataque pessoal. É nestas condições que o pequeno e fechado grupo sectário se autoidentifica como vanguarda, propondo-se mesmo pensar pelo todo.
Da experiência do sectarismo resulta a construção de mundos à parte e a exclusão do diálogo, tornando inimigo quem poderia ser um aliado. É também um vírus que ataca formas de ativismo, construídas por boas razões, mas impedidas pela sua intervenção de se alargarem num quadro de compromisso mobilizador capaz de promover de facto a transformação. O historiador Ussama Makdisi, autor de A cultura do sectarismo, lembra que esta não é mera herança de um passado obscuro, mas fenómeno do mundo moderno, tantas vezes capaz de contrariar princípios que proclama e de alimentar o imobilismo. Falta aos seus cultores a aprendizagem daquilo a que, em Contra o fanatismo, Amos Oz chamou «a importância de tomar café juntos».