O Conselho Económico e Social (CES) completou este ano 30 anos de vida. Francisco Assis, seu atual Presidente, assumiu, publicamente, desde 2021, que a melhor forma de assinalar essa efeméride seria, “fomentar a reflexão e o debate sobre o papel do CES na sociedade portuguesa” (Lusa, 17/8/2021), objetivo que à partida será louvável, se o exercício for rigoroso, designadamente na identificação do que é sociedade civil (CES) e do que é Comissão Permanente de Concertação Social (CPCS). Segundo essa notícia, Assis “encarregou o académico Miguel Poiares Maduro de coordenar esse trabalho”.
A Constituição da República estabelece no seu artigo 92º que, ”O Conselho Económico e Social é o órgão de consulta e concertação no domínio das políticas económica e social, participa na elaboração das propostas das grandes opções e dos planos de desenvolvimento económico e social e exerce as demais funções que lhe sejam atribuídas por lei.” Tomando este enquadramento, as experiências do percurso feito, os problemas socioeconómicos com que o país se depara, e ainda, o contexto europeu e internacional em que as forças mais conservadoras e retrógradas estão a tentar induzir retrocessos civilizacionais, que “alteração da lei do CES e da reformulação de várias das suas práticas internas”, sugeridas por Assis, se deverão fazer?
Na passada segunda feira, São José Almeida escreveu (Público) que o PSD, no seu projeto de revisão constitucional, propõe “a transferência do articulado sobre o CES, para a parte política da Constituição” e que Poiares Maduro é “responsável pela elaboração da proposta”. Este membro do CES, na qualidade de “personalidade de reconhecido mérito” que não se põe em causa, vai assim, desempenhar o papel da clássica rábula de Ivone Silva: Olívia patroa, Olívia costureira.
Quinta feira chegou às livrarias a obra do jornalista Pedro Tadeu “30 Anos de Conselho Económico e Social”, realizada por solicitação do Presidente do CES. Trata-se, de um relato “com base em vinte e nove depoimentos de governantes, sindicalistas, líderes de confederações patronais e antigos presidentes do CES…” (contracapa). Tadeu e Assis (introdução) assumem que os eventos dominantes vieram da “sua estrutura autónoma de maior impacto público, a CPCS” que, por lei, é presidida pelo Primeiro Ministro.
Assis identifica outras fragilidades: “uma certa atrofia no domínio da sua função consultiva”; “dificuldades em afirmar-se como uma instância central na promoção de um espaço público qualificado”; “a debilidade de uma sociedade civil insuficientemente autónoma”; e de o Estado não gostar de “acolher contributos verdadeiramente independentes”. Todavia, não refere enviesamentos de partida na CPCS - tão prejudiciais para trabalhadores e sindicatos - e largamente denunciados por juristas que vão de Jorge Miranda a Luís Sá, de Jorge Leite a Vital Moreira ou a Freitas do Amaral, e por investigadores qualificados.
A riqueza dos 29 depoimentos e a sintética contextualização que o livro apresenta merecem leituras atentas. Como refere Tadeu, deitando mão do que foi dito pelos 29 atores, o CES tem por vocação garantir o relacionamento da “sociedade civil organizada” com o poder político, para o influenciar, mas o reverso tem emergido, ou seja, o poder político tem feito com que aquela caucione “projetos políticos de índole, dimensão, alcance e contextos muito diversos”, nacionais e da União Europeia.
Hoje, não faltam velharias apresentadas como novo e futuro, e sugestões que levam à desqualificação do trabalho e do emprego e ao desarmar do Estado Social de Direito Democrático. A facilidade com que se vende gato por lebre conduz a perigosas aproximações ao velho Estado Corporativo. Haja atenção e ponderação.