Vivemos num país cujo território está infestado por um tipo de árvores que não são autóctones e que, digam lá o que disserem, não me convencem que não secam drasticamente a terra à sua volta ou que essa circunstância não está, no mínimo parcialmente, relacionada com as infernais vagas de incêndios. Dentro do todo deste país, nós, os daqui, vivemos numa região onde há ainda uma percentagem maior de ocupação do território por essa espécie, já visível em consideráveis extensões de mata nacional, dita protegida. Uma região que também é representada por um território designado “interior” — palavra hedionda por aquilo que representa — cuja vida económica se sintetiza num ciclo tendente à desertificação, de pessoas e de terras. Planta-se, ou dissemina-se, essa árvore inominável porque parece não haver nenhuma outra actividade economicamente tão rentável e as pessoas abandonam as terras porque essa árvore, para ser rentável, precisa do trabalho de um reduzido número de pessoas.
É este o ciclo altamente vicioso que, na minha opinião, não se resolve só com turismo e passadiços, nem sequer com o fascínio dos europeus do Norte, atraídos pelo insólito exotismo da circunstância e pelo baixo preço dos terrenos.
Vivemos numa região em que a “floresta”, mesmo ardida, é renovada em dois pares de anos e em que uma parcela muito considerável do espaço serve em exclusivo para a monocultura dessa árvore, passe a redundância, que é enfática.
As poucas e obsoletas vias de comunicação que aqui fazem a comunicação leste-oeste permitem-nos atestar esta realidade irrefutável. Convido todas e todos a percorrer o IP3, a A25, o IC6, o IC8, a N17, a celebérrima N2 e todas as velhinhas estradas nacionais, até mesmo a A13, que a faz no sentido norte-sul. Não parem nas autoestradas, não se pode, mas indiquem-me um local, um só local, em que possa dar uma volta de 360º sem ver um conjunto dessas árvores.
A floresta amazónica é desmatada para plantar soja em massa, cujo destino é alimentar a produção pecuária em massa, cujo destino é produzir carne em massa para abastecer a indústria da alimentação humana.
As antigas matas de toda a região centro, nas terras altas, nas orlas marítimas e nas colinas da transição, foram ardendo e deram lugar a uma monocultura de árvores em massa para... porque...? Só vejo uma explicação possível: porque pareceu a toda a gente que era o melhor que se podia fazer. As árvores são bens essenciais que desempenham um papel fulcral nestes tempos de crise climática, nestes tempos de transição para um futuro que pode ser cinzento, mas que assim, deste modo, dificilmente deixará de ser muito mais obscuro.
As árvores são bens essenciais em todos os ambientes, metropolitanos, suburbanos, urbanos, rurais e florestais, mas é a floresta que as caracteriza, que lhes confere identidade. É a floresta que as torna essenciais para posteriormente se inserirem em todos esses outros lugares.
A cidade também é assim para os humanos, também é nela que se joga, ou que se deveria jogar, a essência das suas vidas, das suas actividades. A cidade, tal como a floresta, também tem um papel muito importante a desempenhar perante a crise climática. A descarbonização e os transportes em comum são parte essencial desse papel. Estamos em pleno no século XXI, o regresso a uma maior densidade urbana é possível. Agora tecnologicamente mais saudável e humanamente mais confortável. Mais, é esse o único caminho para tornar mais eficaz o papel da cidade perante a crise climática.
Prezo muito quem se preocupa com as árvores e quem luta pela sua subsistência, afirmo-o sem qualquer ponta de ironia. Mas prezo ainda mais quem se preocupa com a floresta e quem luta pela sua subsistência.