As políticas obcecadas com o crescimento ilimitado, o lucro, as engenharias financeiras e o determinismo tecnológico, no pressuposto de que tudo o resto vem por arrasto, não cumprem a missão central da política que se situa na construção de respostas aos reais problemas das pessoas, sempre com uma forte carga social. Concomitantemente, geram enredos que bloqueiam a utilização racional, a organização e a coesão dos espaços/territórios em que vivemos, e impedem a construção de estruturas sólidas para o desenvolvimento da sociedade.
A ansiedade social generalizada que hoje se vive resulta de desagrados dos cidadãos. No presente podem relevar-se quatro origens: as precariedades que invadem as nossas vidas e em particular o trabalho; a desvalorização da Administração Pública e do emprego público; o distanciamento dos centros de decisão e, por consequência, a desconfiança das pessoas face às elites públicas e privadas que decidem; a não resolução de tensões - verdadeiras, falsas ou enviesadas - entre os chamados interesses da capital e os do "resto do país".
Na passada quinta-feira, na pré-apresentação do Relatório do Observatório sobre Crises e Alternativas, titulado "A segunda crise de Lisboa" - a publicar no último trimestre do ano -, economistas, geógrafos e sociólogos refletiram sobre as crises que Lisboa (essencialmente enquanto metrópole) e a Área Metropolitana têm vivido. Na ação política e na discussão pública falta rigor na especificação das distintas realidades com que nos deparamos quando falamos do concelho de Lisboa, de Lisboa enquanto metrópole, ou da área metropolitana. Essa lacuna não possibilita a identificação do que é preciso articular nesses três espaços e, ao mesmo tempo, bloqueia a sua relação profunda com as políticas de caráter nacional. Vejamos alguns exemplos.
A decisão sobre o novo aeroporto de Lisboa exige reflexão sobre problemas que dizem respeito à cidade, à metrópole, à área metropolitana, à sua relação com outras áreas e com os interesses dos portugueses do todo nacional. A solução a encontrar na região de Lisboa condicionará ou potenciará as opções para todo o país, nomeadamente as relativas ao caminho de ferro, aos sistemas de transportes e mobilidades, à descentralização e regionalização. Com a aplicação do PRR, quer-se alterar o perfil da economia, ganhando a aposta da utilização das qualificações dos portugueses, das transições energética e digital, do aumento do valor acrescentado. Mas, esse caminho é muito difícil, pois a metrópole Lisboa continua fortemente assediada pelas forças externas que atuaram sobre ela, num processo que consolida a especialização do país em atividades de baixo valor acrescentado.
A região de Lisboa vem empobrecendo. Ela não resistiu à desindustrialização e perde centros de decisão privados que não ficam no território nacional. Grande parte dos cidadãos que nela habita vê as suas condições de vida degradarem-se. Até pode ter havido diminuição das desigualdades, mas num quadro global de empobrecimento. A Área Metropolitana de Lisboa, com mais de 3 milhões de habitantes, está em declínio. É pouco plausível que haja no país outra região com capacidades estruturais e dinamismo que compensem esta perda.
Só haverá soluções para o desenvolvimento do país com políticas transversais devidamente planificadas, aplicadas em várias escalas e articuladas para o todo nacional.