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08-03-2022        A Tarde [BR]

Escrevo a partir do meu lugar de acadêmica e professora na área de Estudos Feministas, ao nível da graduação e do doutoramento, na Universidade de Coimbra. Sem surpresa, é uma área de estudos que encontra algumas resistências na academia, que a classifica como simplesmente política e dificilmente reconhece legitimidade ao conhecimento que produz.

Por outro lado, em sala de aula confronto-me frequentemente com outra ideia pré-concebida. Na última década, tenho oferecido, ao nível da graduação “Temas dos Feminismos Contemporâneos”, com grande procura entre alunas e alunos, incluindo um significativo número de pessoas vindas do Brasil. Ora, o próprio nome exige um debate sobre a relação possível entre investigação/docência e ativismo. Acontece que muitas pessoas se inscrevem na cadeira com a expetativa de encontrar aí um lugar de ativismo puro e duro, pelo que tenho de explicar que, de fato, exige investigação e trabalho – muito trabalho. Num primeiro momento, a tendência geral é a de fazer a simples reprodução de slogans das (justas) pautas que se encontram nos coletivos feministas. Há, pois, que explicar que, para discutir violência doméstica, por exemplo, não basta ler notícias a respeito nos jornais ou consultar outros materiais de divulgação: obriga a investigação, à leitura de ensaios e de estudos de caso, e há ainda que adquirir uma linguagem adequada para falar do que, na vida real, é antes do mais dor e indignação.

Deve a academia fechar-se “à rua” e seguir um caminho paralelo, mas separado? Movimentos e coletivos, em toda a sua variedade, são indispensáveis para a emancipação de mulheres, homens e pessoas não binárias. Geram conhecimento válido; compete à academia contribuir para a sua visibilização e partilhar as ferramentas necessárias a um conhecimento coerente e bem fundado, contribuir para a criação de consciência dos problemas que afetam pessoas em situação de marginalidade e vulnerabilidade, e dar ainda visibilidade às pessoas e aos grupos que desempenharam – e às que desempenham – papéis relevantes no combate pela cidadania plena, em qualquer parte do mundo em que se encontrem. Há ainda que reconhecer que também as pautas dependem do lugar e do momento histórico.

O conhecimento deve ser socialmente relevante, fundado na sociedade e para a sociedade, promovendo os direitos humanos para todas as pessoas e uma maior justiça social, com particular atenção aos grupos sociais vítimas de discriminação e exclusão. Daí que se entenda Estudos Feministas e de Gênero como tendo uma posição de investigação/ação, num lugar diferente, mas numa cumplicidade forte com os ativismos.
 


 
 
pessoas
Adriana Bebiano



 
temas
feminismos    género    academia    sociedade