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04-12-2021        Jornal de Notícias

O mutualismo não é uma velharia, antes pelo contrário, é uma ideia e um compromisso coletivo solidário. A organização e gestão do setor financeiro é hoje instrumento de uma brutal subjugação de países e povos.

Alimenta-se da sucessão de crises que vai gerando e utilizando, como forma de financeirizar a economia e de garantir o enriquecimento de uma ínfima minoria de indivíduos. O resultado é a imposição de uma "economia que mata", como diz o Papa Francisco. Precisamos, pois, de novas formas de organização da atividade financeira e da economia. Umas serão novas, outras podem assentar na reformulação de opções já experimentadas, como a do mutualismo, adaptando-as às condições do presente.

A Associação Mutualista Montepio Geral - a maior instituição mutualista do país, que detém 99% do capital do Montepio Geral-Caixa Económica, mais conhecida como Banco Montepio - foi criada em 1844 e o Banco nos anos seguintes. Um objetivo central presidiu à criação da Caixa Económica: contrariar a ação dos agiotas que proliferavam na sociedade, através da utilização das pequeníssimas poupanças que uma parte dos trabalhadores conseguia fazer, com enorme esforço. Pouco tempo depois da sua criação, Alexandre Herculano escreveu um texto de saudação aos seus criadores, porque estavam a abrir caminhos alternativos à agiotagem.

Esse mundo de agiotagem significava uma atividade bancária sem qualquer regulação e controlo. Todavia, a atual regulação do setor financeiro - no fundamental a autorregulação neoliberal - tende para uma espécie de agiotagem instituída, reconhecida e por vezes religiosamente seguida, não só pelo poder económico, mas também pelo poder político. Trago aqui esta reflexão porque, até 17 de dezembro, se realizam eleições para a Associação Mutualista (há quatro listas), a quem compete definir o rumo do Banco e designar a Administração que o vai gerir. Ora, a Associação vive das poupanças de cerca de 600 mil associados, de entre os quais, cerca de 480 mil podem votar.

Há bastantes anos que o Banco Montepio surge nas notícias e no debate público e político, fundamentalmente, por envolvimento em negócios que o distanciam dos valores e princípios que estão na sua origem e hoje fazem falta à sociedade. A Caixa Económica não foi concebida como banco comercial, e não deve sê-lo, embora também esteja na selva do setor financeiro. Ela deve garantir diferença na capacidade de mobilizar e bem gerir pequenas poupanças; tem condições para trabalhar formas de complementar reformas sem ferir o sistema público e universal da Segurança Social; deve dar contributos para políticas de habitação não especulativas; pode defender o emprego dos seus atuais trabalhadores e criar mais emprego através de novas atividades; deve melhorar o funcionamento dos seus órgãos.

A passagem das competências das assembleias-gerais (até agora centralizadas e dominadas por quadros com contratos de trabalho com o Banco) para uma Assembleia de Representantes, pode aumentar a representatividade dos associados nas decisões da Associação. A possibilidade de, pela primeira vez, quase meio milhão de eleitores usarem o voto eletrónico talvez seja uma experimentação com potencial para outras mudanças.

Por aquela via, por correspondência, ou presencialmente nas cerca de trinta mesas espalhadas por zonas de concentração de associados, o que é preciso é que votem.


 
 
pessoas
Manuel Carvalho da Silva



 
temas
economia    crise    bancos    montepio