Um Orçamento do Estado (OE) tem sempre horizontes limitados pela amplitude das funções a que se destina e pela duração anual, contudo nunca deve apresentar-se desligado de estratégias de médio prazo.
O OE para 2021, entregue pelo Governo à Assembleia da República, não traz sinais seguros nesse sentido. O Governo procura responder aos impactos sociais e económicos da crise pandémica, embora em várias áreas de forma limitada e assume, tenuemente, preocupações sociais. Entretanto, parece ser um Orçamento peado pela desconfiança face às políticas da União Europeia (UE), e pode vir a confirmar-se algo desfasado no tempo.
No final de agosto/início de setembro havia uma perspetiva de recuperação económica com algum otimismo, todavia, o agravamento da pandemia tende a desmenti-lo. Ora, o OE parece inspirado naquele cenário e não na realidade, provavelmente mais dura, que vamos viver.
O país precisa de um OE ambicioso no investimento, coisa que este está longe de ser. Sem investimento público não se reforça a capacidade do Estado, não se puxa pelo investimento privado, não se promove a industrialização e o reequilíbrio territorial. Portugal tem recursos limitados e parte significativa deles está captada por compromissos desastrosos como o do Novo Banco, ou por elefantes brancos nascidos em processos de privatizações e em negociatas que nos deixaram pesadas faturas. Compete ao Governo ir rompendo com as políticas geradoras destas aberrações para que possa haver mais investimento.
É também imprescindível uma política ofensiva no quadro da UE. Os recursos financeiros que daí virão estão ainda carregados de incertezas (prazos, condicionalismos e até volume) e a gestão operacional a pôr em prática é tarefa árdua, mas o Governo não pode ficar tolhido perante ela, nem prisioneiro dos poderes internos e externos viciados em velhas receitas. O dinheiro deve ser investido ao serviço de uma estratégia nacional de desenvolvimento - apoiando e responsabilizando as empresas, a economia social e o setor do Estado - e da melhoria das condições de vida dos portugueses, atenuando desigualdades, eliminando pobreza e dando dignidade a todos.
Muitos dos políticos e alguns empresários que gritam contra este OE porque ele "protege as famílias, mas não as empresas", sabem muito bem que os apoios às empresas estão no OE em várias rubricas, que o dinheiro que sai do OE para apoiar as pessoas mais desprotegidas é uma necessidade imperiosa e se transforma em ajuda indireta às empresas. É claro que não são subvenções entregues a acionistas das empresas sem contrapartidas, como tanto gostam. Os apoios às empresas são necessários e espera-se que a "bazuca europeia" ajude nesse objetivo. Contudo, se queremos uma economia mais robusta e desenvolvimento da sociedade precisamos simultaneamente de: rigorosos critérios de escolha e definição de contrapartidas naqueles apoios; e um forte combate à pobreza.
O OE para 2021 deve ser reforçado na área social considerando os problemas a jusante e a montante. A proteção a quem está muito fragilizado ou totalmente desprotegido é indispensável, porém, se não for criado emprego, se não houver combate à precariedade, se não se melhorarem os salários, o empobrecimento não será estancado e o sistema de proteção social afunda-se.