É mesmo um dever fazermos deste sábado um dia de reflexão sobre a importância das eleições para o Parlamento Europeu e amanhã votarmos. Para mim, como certamente para muitos portugueses, a observação da situação em que se encontra a União Europeia (UE) e da campanha eleitoral em Portugal trouxeram à memória aquela velha imagem do Titanic que avança a toda velocidade para um iceberg, enquanto nos salões da primeira-classe as damas e os cavalheiros bailam e se entretém com jogos florais. Os distanciamentos da realidade que vimos em muitos discursos não nos podem desmotivar, antes pelo contrário, é exatamente a evidência dos graves problemas que estão pela frente, e o faz de conta assumido por certos atores políticos, que mais nos devem levar à utilização do voto.
O pior da campanha eleitoral - não esqueço mensagens com qualidade e cada candidatura merece uma análise específica - resume-se facilmente em três pontos. Primeiro, a atribuição do estado de ameaça de rutura em que a UE se encontra a conspirações externas e internas, em detrimento da identificação das principais causas que o explicam, isto é, as escolhas políticas da própria UE. Essas escolhas resultaram de relações de forças (de programas ou ausência deles) que envolveram todos, mas impuseram-se pelos consensos das famílias políticas ditas do centro, quase sempre urdidos à margem dos cidadãos. Segundo, a repetição encarniçada que alguns fazem da sua conceção de UE, acaba por dissolver críticas indispensáveis para se construírem rumos seguros e deixa muitas pessoas confundidas, pois estas conhecem a dor provocada pelo “austeritarismo”. Terceiro, a tentativa de condicionamento das posições críticas que buscam alternativas, feita através de insinuações ou acusações de que tais forças estão a fazer o jogo dos inimigos, sejam eles Trump, Putin, Le Pen ou Xi Jinping.
Façamos as livres escolhas que nos competem, mas tenhamos consciência de que vivemos com uma moeda única que é fraca de mais para alguns poucos países da União e forte demais para todos os outros. Os primeiros acumulam excedentes para ir às compras de ativos financeiros e reais no exterior, enquanto os outros vivem com o credo na boca devido a défices externos de que, nas condições atuais, não conseguem livrar-se. Se não queremos o desmoronamento total da União há que encontrar soluções para este problema, como para o das dívidas externas (públicas e privadas) que se agigantou durante a intervenção da troica e permanece ameaçador sobre as nossas cabeças.
Será imprescindível discutir o que fazer com um sistema financeiro que não deixa de nos parasitar, sob a supervisão de um BCE que dá ordens mas não responde pelas consequências; o que fazer para reverter o aspirador demográfico do centro da UE, que nos tem levado os mais jovens e mais preparados operários, quadros e intelectuais.
Em dia de reflexão procuremos percecionar o que é o problema e o que é a solução. Pode bem dar-se o caso de o fundamental do problema estar, em primeiro lugar, onde nos dizem estar a solução. O Titanic avança e é grande de mais para mudar de rumo por efeito de golpe de génio de última hora. Será bom fazer soar o alarme, organizar os passageiros, preparar os salva-vidas. Votemos.