Os sinais não são de agora, mas ganharam particular relevo nos últimos tempos. A maioria dos grandes jornais especializados na atualidade, no comentário político, na informação generalista e na vida cultural, vive uma fase crítica e tem vindo a perder leitores de forma rápida e exponencial. E não apenas no que respeita às edições em papel, uma vez que o crescimento do digital, notório nos anos mais recentes, parece também ter parado. As razões são múltiplas e complexas e têm uma dimensão global, centrada em particular nos países nos quais a indústria do entretenimento e a proliferação da informação rápida e superficial têm sido mais fortes e constantes. Em termos relativos, aliás, lêem-se hoje menos jornais na Itália ou no Japão que na Índia ou na Costa do Marfim.
Claro que, no caso português, a tendência se encontra também associada a um atávico e disseminado desinteresse, junto da maioria da população, pelo hábito da leitura. Mas os recentes acontecimentos, em títulos como o Diário de Notícias ou o Público, objeto de despedimentos e de pesados cortes nas modalidades de edição, colocam um problema de natureza claramente diversa, dado o mesmo não ocorrer, por exemplo, com o tablóide Correio da Manhã. À redução generalizada do interesse pela leitura de jornais, ou à crescente concorrência entre diferentes suportes da notícia, soma-se de facto uma situação que não pode ser separada das opções editoriais que as direções dos jornais nacionais têm tomado.
O êxito comercial do Correio da Manhã, diário sensacionalista de formato popular vocacionado para um público menos exigente com a riqueza da escrita ou com a exatidão das notícias, em boa parte associado à leitura partilhada em cafés, salas de espera e outros sítios públicos, é compreensível. Mas no caso dos dois títulos generalistas mencionados, o que parece evidente é que a sua linha editorial mais recente, demasiadas vezes conformista e próxima das posições do anterior governo, e que poucas vezes tem em linha de conta os interesses e as expectativas de uma classe média razoavelmente culta e politicamente mais comprometida que habitualmente os lê ou lia, tem ampliado a desafetação e o desinteresse.
Compreende-se que os grandes jornais nacionais pautem a linha editorial por escolhas políticas e estratégias que não prejudiquem os seus interesses comerciais. Mas já é difícil de aceitar que alienem um número crescente de leitores, que nestas condições acabam por deixar de comprar o seu «jornal de sempre». Na verdade, não se percebe que, num país com razoável nível de literacia básica, e no qual cerca de 60% dos cidadãos vota claramente à esquerda, não exista imprensa que, mantendo-se plural, reflita os interesses e as expetativas, a visão do mundo e o padrão de exigência nas questões sociais e culturais, que este segmento social de alguma forma partilha. A mera força do hábito ou as tendências masoquistas não chegam para fidelizar os leitores. Desta forma, não pode haver surpresa quando os balancetes se inscrevem em cenários cada vez mais pessimistas. Afinal, sem leitores regulares e dedicados, para quê escrever, anunciar ou publicar?