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24-01-2016        Público

Que cada um de nós tenha a coragem de dizer a todos e cada um dos fundamentalistas (os nossos e os deles): No pasarán!

A Europa é uma ficção? Uma página do futuro escrita aos tropeções? Por vezes parece. Algumas das políticas europeias, pelo menos, aproximam-se muito da ideia de uma realidade paralela que só vive na nossa imaginação. Talvez dê um filme. No dia em que escrevo este texto a ideia de uma política europeia de migrações é isso mesmo. Uma ficção que nos estimula o pensamento e...

A política Europeia de Asilo é um somatório da nacionalização de políticas contraditórias (e quase sempre erradas). 2015 foi o ano de todos os desafios e de todos os recordes (pelo menos antes dos próximos). Olhando para trás o que está feito e o que falta fazer? Pouco. Muito. O Inverno passa, lentamente, o sistema do ano passado ainda não está no terreno. Acabou 2015? Viva 2016. Dos 160.000 refugiados a distribuir pelos 28 Estados da UE saíram da Grécia e de Itália umas parcas centenas. Muitos recém-chegados, de forma independente, ousaram atravessar países (e recriaram fronteiras) comprovando a falência do Sistema de Dublin e desafiando a União Europeia a reagir. A política sobrepôs-se à realidade, inventaram-se inimigos e construíram-se muros e cercas que nos condenam a viver do lado de dentro de uma Europa-fortaleza. Resolveram-se os problemas de 2015? Não.

Mesmo assim a União conseguiu recuar face a 2014 (quando era suposto avançar). Temos hoje menos Europa. Olhando para trás falta estrutura, infra-estrutura e superestrutura. Falta dinheiro (falta mesmo muito do dinheiro já anunciado), mas não faltam discursos ficcionados sobre o assunto. A Europa não está a ser invadida. A Europa não está a ser invadida. Há homens, mulheres e crianças que fogem de uma guerra em países vizinhos para países vizinhos (nós). Um milhão de pessoas chegou à Europa e pediu asilo ou veio refugiar-se na Europa? Não. Um milhão chegou à União Europeia no ano da graça de 2015 e juntou-se aos mais de 500 milhões que já por cá viviam. Temos medo de uma relação de 0,002 de refugiados versus população residente? Na Europa, onde incluo os EU 28 mais os que sobram na Europa geográfica, estão hoje muitos mais e mesmo assim não fomos invadidos. Só na Turquia, em 2015, atingiu-se o número de 1,9 milhões de refugiados incluindo 1,7 milhões de refugiados Sírios. E, sim, a Turquia também é Europa. Olhar em frente ou fechar os olhos com medo do futuro?

À medida que as ideias da extrema-direita se tornam parte do mainstream europeu a União Europeia começa a perder o seu lugar no mundo real. Da ideia de invasão à islamofobia o caminho fez-se, quase todo, muito depressa e pelo pior percurso possível. Em cada refugiado um terrorista. Em cada terrorista um mouro invasor. Em cada momento o medo de que a fortaleza impluda. Nada fazer, pelo medo de errar, condena o futuro a ser pior do que o presente. Muito pior.

Já devíamos saber que através da partilha do medo nunca será possível vencer o terrorismo. Muros, restrições à liberdade de circulação, censura, menos democracia, não podem gerar as mudanças de que necessitamos na União Europeia. Não se produz integração através da desfragmentação dos ideais comuns. Não se constrói futuro comum através do isolamento egoísta. Não se cria solidariedade maleficiando o próximo. E nunca falar do próximo fez tanto sentido. O próximo chegará na próxima primavera atravessando o mediterrâneo em barcaças 2.0.

O Papa Francisco “espera que a Europa se afirme como um farol de humanidade apesar dos receios de segurança motivado pelo mar de gente que tem procurado abrigo no velho continente”. Eu, mais modesto, espero que a Europa seja capaz de continuar a sonhar com um futuro. Que seja capaz de encontrar um projecto de integração e solidariedade. Que seja capaz de descobrir, no mesmo sítio onde estavam os fundos que salvaram a banca, os fundos necessários para salvar os homens, mulheres e crianças que fogem das bombas, da fome e da miséria. E que cada um de nós tenha a coragem de dizer a todos e cada um dos fundamentalistas (os nossos e os deles): No pasarán!


 
 
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Pedro Góis



 
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