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17-01-2014        Diário de Notícias

Robert Cox, académico canadiano da área de Relações Internacionais, sugere que a governação global efetivamente existente tem como protagonista uma rede de contornos difusos, envolvendo empresas, governos, fazedores de opinião e operadores institucionais dos mercados mais influentes em cada momento. Cox chama sugestivamente a essa entidade “a nebulosa”, pondo assim em destaque a falta de nitidez da sua institucionalidade e dos seus canais de expressão.

A nebulosa produz pensamento, define padrões de política e recruta os melhores quadros para as pôr em prática. Em bom rigor, os governos nacionais são apenas os intérpretes de fim de linha deste modo de governar o mundo. Com uma influência muito mais forte na fabricação de decisões alinhadas por padrões de alcance internacional está esse grupo estranho que dá pelo nome de “facilitadores”. Os facilitadores são os intermediários entre a nebulosa e as instâncias locais de decisão. São tipos cinzentos, que se movem discreta e habilmente nos círculos do poder, fazendo um vai-vem permanente entre o mundo dos negócios e o mundo da política, que vêm à boca de cena debitar normas de boa governação carregadas de princípios de ética pública ao mesmo tempo que, na sombra dos seus escritórios preparam diplomas legislativos destinados a favorecer interesse particulares que lhes pagam principescamente para o efeito. Os facilitadores facilitam, claro. Mas facilitam sempre o mesmo e para os mesmos.

A porosidade entre os negócios e a política tem uma escala nacional conhecida, que nem a institucionalização do lobbying nem a fixação de um período de nojo mínimo conseguirá prevenir. As regras formais valem pouco diante de uma realidade informal feita de cumplicidades fundas traduzidas na defesa de interesses privados através de cargos públicos. Os que passam subitamente do governo onde tiveram a tutela de uma área para um operador privado dessa área são apenas o rosto mais obsceno de uma realidade tentacular muito mais complexa. Na verdade, ao exporem-se de modo tão aberto, esses facilitadores complicam a vida aos seus mentores mais do que facilitam.

Na promiscuidade entre a política e os negócios como no futebol, o campeonato português é subalterno. Há uma champions league com o estrelato político e empresarial – e salarial, já agora…– onde pontuam figuras como Mário Draghi – que ziguezagueou entre o banco de Itália, o Gopldman Sachs e o Banco Central Europeu – Peter Sutherland, com um percurso entre o Royal Bank of Scotland, a Comissão Europeia e o Goldman Sachs – ou Robert Zoellick, que transitou de funções de direção do Goldman Sachs para o Banco Mundial  regressando depois ao Goldman Sachs.

Pelos exemplos dados, salta à vista que o banco Goldman Sachs é um clube dessa champions league que é a nebulosa da governação global. Esse “nicho de um poder mundial não eleito” – como certeiramente o designou Viriato Soromenho Marques – faz da governação global a sua especialização de mercado. Uma governação global feita de bolhas especulativas, de cumplicidade com o falseamento de contas públicas, de promiscuidade entre governos e negócios, de manipulação dos mercados cuja liberdade e transparência apregoa. Foi para esse clube que José Luís Arnaut, deputado do PSD, advogado de várias empresas privatizadas por governos que apoiou politicamente, ex-ministro, foi agora recrutado. No futebol como na facilitação de um relacionamento “agradável e útil” entre o mundo dos negócios e a política, os clubes da champions estão atentos aos campeonatos distritais. E recrutam quem neles sobressai.
 


 
 
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José Manuel Pureza



 
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