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31-08-2013        Jornal de Notícias

Numa semana em que se observam comportamentos despudorados do Governo e da troika, querendo impor uma ignóbil redução dos salários e das pensões de reforma, em que o Tribunal Constitucional confirmou, uma vez mais, que o Governo PSD/CDS jamais se predisporá a governar dentro dos parâmetros constitucionais, abordo o tema da saúde, porque é meu sincero entendimento estarmos perante um problema grave.

O Governo vem colocando em estado mórbido o direito universal e constitucional dos portugueses à saúde. Estamos regredindo aceleradamente no setor em que se haviam atingido os mais elevados índices de desenvolvimento. É preciso esclarecimento e luta contra o rumo que está a ser seguido. Esse será o antídoto que pode evitar o estado de septicemia e a morte do Serviço Nacional de Saúde (SNS).

Sobre os efeitos demolidores da recessão económica, da austeridade violenta, do empobrecimento galopante, converge uma atuação estratégica do Ministério da Saúde que, em pezinhos de lã e agora mais à bruta, vai destruindo capacidades, meios e objetivos fundamentais do SNS, e bloqueando o acesso a grande parte dos portugueses.

Os grupos financeiros do "mercado da saúde" promovem o processo e aplaudem. Conservadores saudosistas que ainda não digeriram bem o regime democrático incentivam a entrega dos hospitais às Misericórdias (a caminho desses grupos financeiros?) na perspetiva de que na saúde e na proteção social hão de instituir um sistema de "caridadezinha" que submeta os cidadãos necessitados, tornando-os dóceis mas despidos da dignidade que a plena cidadania permite.

É imprescindível refazermos a nossa memória para ambicionarmos objetivos de progresso e sermos capazes de lutar por eles. A sistemática invocação da crise, escondendo as suas verdadeiras origens, causas e consequências, permite aos governantes apresentar propostas descontextualizadas, mas ardilosas, que até parecem coerentes. É isso que faz o ministro do setor. Se este governo se mantiver no poder ainda podemos ouvir o ministro dizer que fez tudo o que podia para defender e rentabilizar o SNS, mas que não lhe foi possível salvaguardá-lo. Vivemos tempos de muita hipocrisia e malvadez à solta.

O primeiro-ministro insinuou no passado sábado que o Estado vai extorquindo impostos e mais impostos aos portugueses e que cada vez lhes dá menos. Ele que dirige o Governo que mais aumentou a carga fiscal e mais cortes fez naquilo que o Estado pode e deve dar aos cidadãos: condições de saúde, de ensino, de proteção social, de segurança; infraestruturas básicas e investimento gerador de emprego e riqueza.

Como denunciou o Sindicato dos Enfermeiros Portugueses, "o próximo ano revelar-se-á como o primeiro em muitos anos cujo orçamento para a saúde está muito abaixo da média dos países da OCDE". Dirão alguns: não há dinheiro, é inevitável! O problema é que o dinheiro, em vez de ir para a saúde e prestação de outros direitos sociais fundamentais, vai para os "mercados" da dívida, da saúde, do ensino, dos negócios das swaps, ou para cobrir roubos escandalosos feitos aos interesses coletivos.

Num estudo oportuno sobre a situação económica e financeira do SNS e a sua sustentabilidade futura, Eugénio Rosa registou que já em 2010 "a despesa pública com a saúde em Portugal representava apenas 60% da despesa total com a saúde, enquanto a média europeia era de 73%".

Os cortes na saúde previstos no "Memorando" já foram ultrapassados em 500 milhões de euros, e a destruição prossegue. Agora, também com o corte de 4% das despesas com pessoal nos centros de saúde, estrutura vital de um SNS que aposte na proximidade, no acompanhamento das pessoas que mais precisam, como os idosos, as grávidas ou os jovens no que diz respeito ao planeamento familiar. O seu bom funcionamento é determinante, para a saúde preventiva e para se evitar gastos futuros. Mas isso não serve o negócio dos hospitais e de outras estruturas colocadas nas mãos do "mercado" da saúde.

Temos dos melhores médicos, enfermeiros e profissionais de saúde do mundo. O Governo maltrata-os e escorraça-os dos lugares em que deviam estar, do SNS e até do país, porque as suas competências e qualidade são obstáculo ao retrocesso.


 
 
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Manuel Carvalho da Silva



 
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