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07-07-2013        Público [Revista 2]

Como muitos milhares de portugueses, cometi o erro de não ter frequentado um curso superior de Gestão ou Finanças. No meu tempo, aliás, era contra esses cursos que nos inscrevíamos na universidade, em Artes ou Humanidades. Era uma opção de vida que parecia legítima mas que agora se revela praticamente anarquista.

A ideia era: embora goste de Matemática, talvez possa viver sem as suas fórmulas; embora goste de dinheiro, talvez não seja obrigatório obter um diploma de como geri-lo.

O mais letal da actual crise, para lá do desemprego e do empobrecimento, é que tudo passou a ser finanças. No meu tempo, havia um primeiro-ministro que era professor de Finanças e isso parecia distinto, quase excêntrico. Passados alguns anos, todos temos de o ser, até o Presidente da República.

Já Pessoa dizia que Jesus Cristo "não sabia nada de finanças". Mas isso foi há dois mil anos. Muitos de nós "não sabíamos nada de finanças" há dois anos. Vivíamos, vejo agora com nitidez, como os hippies da Drop City, no Sul do Colorado, no final dos anos 1960: a fazer cúpulas geodésicas com tejadilhos de carros alheios.

Antes havia um acordo de paz: nós não nos interessávamos por bancos e os bancos não se interessavam por nós. Não era um assunto sexy. Agora temos uma voyeurística webcam permanentemente ligada às administrações, para os fins mais perversos.

Para os arquitectos, uma espécie de ministro das Finanças é o medidor/orçamentista. Os "erros e omissões" do projecto são o momento da verdade, à maneira de um memorando da troika. Cumprir o orçamento disponível? Há um arquitecto famoso por o fazer: Frank Gehry. Os processos digitais de articulação do projecto e construção costumam explicar esse sucesso. A vizinhança de Hollywood é, quanto a mim, mais decisiva...

Em Inglaterra, foi feita uma proposta de introdução de conceitos de gestão para crianças com 3/4 anos. Na universidade, a tendência é que todos os cursos comecem com disciplinas de Empreendedorismo, Gestão e Finanças, seguidos da "especialização" em causa: Latim, Tecelagem, História de Arte. Aos cursos de Engenharia Civil, Mecânica, ou Informática, deverá seguir-se o de Engenharia Financeira e pós-graduações em "psicologia financeira" e em "química financeira".

Com gravidade, Daniel Bessa afirmou recentemente que somos governados por "administradores da massa falida". Não consegui deixar de pensar nos Relógios Derretidos de Salvador Dalí e até no Enigma da Hora de Giorgio de Chirico, mas depois acordei.

Há quem pense que vivemos uma crise do capitalismo. Não pode ser crise se é o ar que se respira já dentro das nossas casas, entrando pelas tábuas do soalho, pela alcatifa, pelo ar condicionado ou pela janela aberta. Tudo é capitalismo. Ou, na sua versão poética, futebol.


 
 
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Jorge Figueira



 
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