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25-06-2013        Público

A democracia portuguesa, debilitada nos seus fundamentos, tem especiais debilidades no nível autárquico. Mas há muitas razões para ver na democracia local o ponto fulcral de refundação democrática num país sujeito a uma violência inaudita, que feriu a dignidade dos cidadãos, e o desvalorizou profundamente.

Em Coimbra constituiu-se o movimento Cidadãos por Coimbra. José Augusto Ferreira da Silva, um advogado de percurso exemplar, é o candidato à presidência da câmara. Eu encabeço a lista da assembleia municipal, pois partilho com muitos, figuras ativas da vida da cidade, uma visão de que fazem parte os seguintes pontos.

O município como lugar central de uma democracia a revigorar pela participação, pela transparência pública e pela construção de soluções para os dramas das pessoas e da vida coletiva. Salvo exemplos que merecem respeito, são demasiadas as autarquias que têm hostilizado a participação dos cidadãos e se constituíram em lugares fáceis para interesses, negócios obscuros e até corrupção. Hoje, a luta decisiva, o ponto diferenciador, é fazer entrar os cidadãos na vida política local: como sujeitos da ação, destinatários da informação, garantes da transparência e legitimadores das deliberações. Isso faz-se com compromissos básicos e práticas sãs. São pontos cruciais do projeto democrático impedir a destruição da administração pública local e a transformação das suas funções em mercados privados guiados pelo lucro e alheios aos cidadãos (a água é o grande assunto, mas não o único). E há um novíssimo ponto: vamos eleger a administração local de um país devastado por política cruéis e habitado por pessoas desprotegidas, muitas à beira da miséria. A marca política da instituição municipal tem hoje de ser refeita pelo modo como incorpore as políticas sociais: apoio aos excluídos, organização da educação e da saúde, promoção do emprego e das qualificações. A política local há de, em tudo, deixar de ser dos negócios para ser da cidadania local.

Reversão urgente de um urbanismo devastador e desqualificado. As cidades expandiram brutalmente os seus perímetros urbanos, foram servis perante os interesses dos que embolsaram rendas fundiárias à custa do bem-estar coletivo, desertificaram os centros, tornaram a habitação pasto do lucro fácil, hipotecando o seu papel fundamental na definição da própria cidade, renderam-se à mobilidade através do automóvel e do negócio que o rodeia. Só com opções políticas claras se altera esta ordem da desordem. Eleger o centro urbano e os núcleos consolidados da cidade como a prioridade da política de solos, da autorização de construção pela reabilitação, da ação pública em matéria de habitação, da organização da mobilidade é essa opção, de que deve fazer parte a estrita contenção (ou mesmo redução) das áreas urbanizáveis.

Multiplicar o valor da economia da cidade. As cidades, em geral, com as suas instituições, consensos e sentido humano são essenciais para reconstruir a economia devastada por políticas vis, pela especulação financeira, pela destruição do valor do trabalho e do emprego. Há margem e capacidades para isso. Coimbra é exemplar deste ponto de vista, pois desenvolveu nas últimas duas décadas uma economia avançada de grande qualidade baseada na informática e nas tecnologias da informação, na saúde ou na biotecnologia. Atraiu e fixou profissionais de elevadas competências académicas. São casos multiplicáveis. Pelo emprego, pela criação de riqueza, pela sustentabilidade da vida urbana. A condição é a mais elementar: que a enorme diferença que tem existido em Coimbra entre a economia e a medíocre governação política se desfaça, assumindo-se o município como parte inteira de um cluster urbano de capacidades produtivas avançadas.

Recuperar o valor do território e organizar o país. A desatenção da última década, as decisões erradas e a persistente tendência centralista fragilizaram o país desvalorizando o território. Lisboa está mais rica do que os outros mas está ameaçada pelas sua periferias pobres e fragilizada por um país desequilibrado. Coimbra é a parte principal do único sistema urbano estruturado com dimensão mínima (400 mil habitantes) fora das influências metropolitanas. Um país ordenado e mobilizado depende do valor político deste território. As cidades médias europeias que valorizam os respetivos países são semelhantes a Coimbra. Representar solidariamente este território de vários municípios é um propósito que Coimbra tem de assumir, com lealdade e cooperação com os vizinhos com que partilha uma economia comum.

Referi só estes pontos por razões de espaço. Mas a cidade é também conhecimento e ciência, cultura e espaço público inteligente, ambiente e renovação da sustentabilidade ameaçada pela crise. Para tudo isto há que convocar a democracia, a intensa participação dos cidadãos, a transparência, a capacidade de luta contra a devastação da legitimidade democrática, a oposição às políticas que têm atacado a dignidade do trabalho e desfeito a economia e a sociedade. Em Coimbra vai ser assim. Há quem queira recuperar a cidade solidária, a democracia, a transparência e a legitimidade, a capacidade para criar na vida local as soluções que a dignidade exige. Isto vale para a pólis e vale para o país.


 
 
pessoas
José Reis



 
temas
democracia    autárquicas    Coimbra    cidadania