A inscrição da Universidade de Coimbra Alta e Sofia (UCAS) na lista da UNESCO não surpreendeu nem deixou de se oferecer como uma muito agradável surpresa. Não surpreendeu porque os argumentos para esse reconhecimento à luz dos requisitos próprios são imbatíveis. Constitui uma surpresa porque, no fundo, apenas um pequeno grupo de universitários, de indivíduos empenhados nas questões do património e de cidadãos de Coimbra se manteve entusiasticamente a par do longo processo, mesmo quando já quase só faltava a decisão.
Como o tema dado para esta intervenção foi o do que pode valer para Coimbra esta distinção, penso que a chave reside na resolução pela positiva desse eventual paradoxo, ou seja, fazer com que um património de características ímpares seja proactivamente reconhecido enquanto tal, não só pela humanidade, mas também pelos cidadãos e agentes locais, regionais e nacionais.
Há muito que defendo que não é no edificado da UCAS que reside o fulcro da sua valia patrimonial universal, nem sequer na antiguidade e tradições desta univerCidade, mas sim no papel desempenhado pela Universidade de Coimbra enquanto única do Império até à República. Império que foi um dos dois primeiros de âmbito mundial e do qual, por entre as variadíssimas resultantes, pontuam as de carácter cultural e nelas a língua.
Além de docentes, médicos, juristas, historiadores, cientistas e outros bacharéis, licenciados e doutores portugueses enviados para o Império, são incontáveis os filhos das colónias que fizeram a sua formação superior em Coimbra. Também incontáveis os membros das ordens religiosas que nos respectivos colégios-conventos viveram Coimbra necessariamente de outra forma com o mesmo fim. No fundo, Coimbra foi a primeira universidade para todos os países de língua oficial portuguesa.
Claro que esse vastíssimo património imaterial tem como referente o espaço e a imagem de Coimbra, em especial naquilo que lhes é conferido pelo edificado da UCAS que, cumulativamente, tem valor próprio mais do que suficiente para arcar com toda a carga representativa que o historial universal da Universidade de Coimbra sobre ele foi carregando. Edificado no qual convergem ainda outros valores também directamente ligados à identidade portuguesa, como, por exemplo, o de centro do poder dos monarcas que fundaram e consolidaram a nacionalidade.
O edificado, o espaço e a imagem de Coimbra têm pois um valor universal como pólo crucial da portugalidade, o qual acaba de ser reconhecido fora e que necessita de ser reconhecido, de forma consequente, dentro. Dentro da comunidade local, mas também nacional e naquelas onde a influência portuguesa ainda se faz sentir.
Além disso Coimbra tem potencial, mas não resulta. E se neste momento de festa invoco esta situação negativa, é apenas porque este reconhecimento é a ignição que a cidade procurava para que passe a resultar.
Vale pois a pena promover uma reflexão colectiva sobre o significado real deste reconhecimento internacional. Só assim poderão ganhar contornos claros as verdadeiras e valiosas oportunidades emergentes e ganhar para eles a comunidade, criatividade, parcerias, dinâmicas de governância, investimento solidário.
Esse colectivo tem de ser entendido no mais amplo, numérico, cultural e geográfico sentido do termo. O valor de Coimbra é universal, assim tem de ser a sua estratégia.