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15-04-2012        Público/Revista 2

Há já muito tempo que os arquitectos desistiram de ter um discurso sobre a cidade que se distinga do que é óbvio e do que qualquer um pode dizer. Ao longo do século XX, no entanto, a cidade foi sempre uma questão nevrálgica.

Depois da defesa das "tipologias";, da "cidade-quarteirão"; e da "malha";, nos anos 1980, nunca mais se ouviu uma palavra. Concluindo que a construção da cidade lhes escapa largamente, os arquitectos concentraram-se pragmaticamente naquilo que conseguem controlar: os edifícios. Nos últimos vinte anos, a excepção notória foi Rem Koolhaas e, em particular, Generic City, um texto de 1994. Adoptando os "olhos que vêem"; de Le Corbusier e "aprendendo com";, como Venturi e Scott Brown em Las Vegas, Koolhaas faz um retrato hiperlúcido, quase cruel, da urbanidade global. Na Cidade Genérica, há uma alucinação do normal, uma calma peculiar, um estado de sedação; os centros podem ser os aeroportos; uma identidade iconográfi ca é omnipresente; por cima está uma cidade de resíduos; por baixo, regimes ditatoriais ou autoritários.

Em Generic City, o principal alvo a abater é o "lugar";, uma retórica central no discurso dos arquitectos (principalmente dos portugueses…). Koolhaas conclui que a nostalgia do lugar não faz qualquer sentido nas cidades em expansão ou emergentes. E que mesmo nos centros históricos há um paradoxo insanável: para permanecerem autênticos, precisam de ser reabilitados; e a reabilitação vai-lhes destruindo qualquer autenticidade…

Sobre estes temas, Marc Augé escreveu um livro famoso, Não-Lugares (1992). Mas a vantagem dos arquitectos, quando tocam num nervo, é que não se ficam pelo diagnóstico. A arquitectura de Koolhaas foi de facto integrando o vazio e a opacidade da Generic City e traduzindo a sua temperatura fria, pornográfi ca, sem redenção. Com Delirious New York (1978), Koolhaas tinha resgatado Nova Iorque para a cultura arquitectónica (depois de Le Corbusier ter dito que estava tudo errado); em Generic City, a cidade asiática irrompe como modelo global e viral.Como é óbvio, trata-se de uma abordagem controversa. Nos últimos 10 anos, em parte como oposição a esta deriva, assistimos a um regresso do "social";.

Paulo Moreira, o arquitecto que venceu há duas semanas o Prémio Távora, tem trabalhado sobre a Chicala, um dos musseques mais centrais de Luanda. Tão central que da Fortaleza de S. Miguel se tem uma impressionante vista panorâmica. Como parte da investigação, Paulo Moreira viveu lá e vai continuar a levantar e a defender a ordem e a ética da Chicala. Embora esteja já em curso uma intervenção para essa zona - o "Novo centro da cidade"; - que é hipnoticamente monumental e irremediavelmente genérica. As forças imbatíveis da cidade genérica estão aliás a tomar Luanda.

Por agora, depois de Koolhaas, a única resposta dos arquitectos para o problema da cidade contemporânea parece ser ir viver para os musseques


 
 
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Jorge Figueira