Foi divulgado esta semana o resultado da terceira revisão do programa da troica. "No seu conjunto o programa corre sobre os carris"; diz a troica, saudando o Governo pela sua prestação. Dizem que o "ajustamento fiscal"; é "notável";, a "desalavancagem do setor financeiro está a progredir";, as "reformas nos mercados de trabalho"; estão a avançar.
Quando já é absolutamente claro que a "austeridade"; em contexto recessivo e o "ajustamento estrutural"; estão a aprofundar as crises europeias, e no próprio FMI se tornam mais audíveis as vozes que o reconhecem abertamente, a troica precisa de propagandear histórias de sucesso. Neste relatório Portugal foi escolhido para contar uma delas.
Pouco importa que o desemprego tenha ultrapassado a barreira dos quinze por cento, que o "ajustamento fiscal"; esteja comprometido pela quebra das receitas, que a diminuição das exportações inviabilize a "única"; fonte de crescimento possível, que a "desalavancagem"; do setor financeiro esteja a ser feita à custa do financiamento da economia, que se assista a uma acelerada destruição de empresas em resultado da diminuição de salários, pensões e rendimentos do povo, que a destruição de serviços públicos torne inacessível o acesso à saúde para muitos portugueses.
Pouco lhes importa as injustiças, o sofrimento e a pobreza resultantes das alterações ao regime do subsídio de doença, dos cortes no Rendimento Social de Inserção, da diminuição da proteção na maternidade e na paternidade.
Para a troica e o Governo, que se comporta como governo de um país ocupado – veja-se as trapalhadas e mentiras sobre o corte dos subsídios de Natal e de férias –, tudo isto são "riscos";, ou "sacrifícios necessários";, nada mais do que isso; o programa é perfeito e está a ser executado de forma exemplar!
Os perigos acumulam-se: os ataques aos mais diversos setores profissionais, dos setores público e privado, colocaram no senso comum a ideia de que os direitos no trabalho são privilégios, enfraquecendo a sua capacidade de reação e luta; o empobrecimento das classes médias (instituíram que pertence à classe média quem ganha mais que o salário mínimo) está a manietá-las e a provocar ruturas de solidariedade; a estigmatização de grupos mais desprotegidos, desenvolvendo invejas entre pobres e paupérrimos, cria o clima propício para um brutal ataque à segurança social e a outros direitos sociais universais e solidários.
Na realidade "os riscos"; de que nos falam não são mais que fatos e resultados previsíveis das políticas em curso, não só do que está a ser executado em Portugal, mas de todos os programas semelhantes, da Grécia e da Irlanda a toda a União Europeia, com relativa exceção da Alemanha.
É dramático ouvir os senhores da troica expressarem preocupação pelo "aumento mais rápido que o previsto do desemprego";, eles que sabem muito bem da preocupante possibilidade de o desemprego ultrapassar os 20% no prazo de um ano, em resultado das políticas que estão a ser implementadas.
Na Europa capitaneada por uma direita neoliberal, que está a fazer da crise uma oportunidade para aplicação de um programa não sufragado de destruição do Estado Social, o ar está a tornar-se irrespirável.
O sucesso na implementação desta agenda política perigosa, sustentada numa ofensiva ideológica reacionária ocultada pela propaganda e posições repetidas nos grandes meios de comunicação é, para a generalidade do povo, empobrecimento, insegurança e infelicidade que os poderes dominantes querem individualmente sofrida.
Entretanto, de Espanha e de França, da Itália, e de Portugal também, por vezes de onde menos se espera, chegam sinais de superação da atomização e do conformismo, de disponibilidade para a ação coletiva. Por aí passa a esperança e confiança no futuro, indispensáveis para a exigência de coisas tão simples e elementares como a afirmação do valor do trabalho na vida das pessoas e na economia, a satisfação de necessidades básicas, o combate às desigualdades e à pobreza, que se constituem como os fundamentais conteúdos de políticas alternativas.