Por muito que os nossos governantes gritem "nós não somos gregos";, as suas políticas conduzem-nos, infelizmente, à mesma situação que a Grécia está a viver. Temos de desconstruir o slogan e de agir contra o desastre, e não nos iludirmos pelo facto de a estratégia de humilhação seguida pela Alemanha ser – também por razões históricas e de geoestratégia – mais ofensiva contra o "mau exemplo"; grego.
Confirmam-se os efeitos desastrosos dos sucessivos pacotes de austeridade.
O desemprego e o subemprego atingem diretamente mais de 1.160.000 trabalhadores (mais de 20% da população ativa), sendo que apenas 1 em cada 3 tem acesso ao subsídio de desemprego. Há uma faixa etária jovem, com formação escolar significativa, em que a soma dos desempregados com os que emigraram atinge 50% do total dessa população, significando forte fator de empobrecimento do país.
O Governo tenta, em propaganda, dar sinal de preocupação face ao imenso desemprego, anunciando a intenção de criar 3.000 empregos por mês. Mas o aumento do desemprego traduziu-se, só no último trimestre, em 81 mil novos desempregados. As medidas que vêm sendo tomadas no plano nacional, ou até na Alemanha, no que diz respeito
à criação de emprego jovem, são de cada vez mais dura precariedade, com imposição de salários miseráveis que os jovens vão ter de recusar em defesa da sua dignidade e do futuro dos seus países. Estamos perante uma preocupante degradação da qualidade do emprego e aumento da pobreza. Inevitavelmente aumentarão a insegurança e a criminalidade.
A redução do emprego atinge todos os sectores, mas é mais intensa na indústria. Isso significa que continua a destruir-se o sector produtivo, o que nos coloca em situação de maior dificuldade para se encetar a necessária recuperação económica.
A diminuição das condições de acesso a direitos sociais fundamentais na saúde, na educação na proteção social e na mobilidade das pessoas está a processar-se a toda a velocidade, sendo tremenda para centenas de milhar de portugueses.
As receitas fiscais estão em queda acentuada. A meta estabelecida para o défice está comprometida e surgirão mais apertos sobre a despesa, ou seja, cortes duros no Estado Social e novos ataques às condições de trabalho e de vida dos trabalhadores, bem como ao emprego público, mesmo que sob a forma de imposição de mobilidades insuportáveis.
O Primeiro-Ministro, o Governo e o Presidente da República desdobram-se em discursos e atitudes de aparente partilha de preocupações com o povo, e de incentivos morais ao "empreendedorismo"; e à criatividade, num claro exercício de quadratura do círculo carregado de hipocrisia, pois, objetivamente, seguem as políticas da Senhora Merkel e seus aliados.
Nos últimos dias, as previsões da União Europeia para 2012 mostram-nos a economia grega a cair 4,4% e a portuguesa logo a seguir na queda, com 3,3%.
Entretanto, os decisores políticos que fazem esta constatação vão persistir nas políticas de desastre. Para eles a responsabilidade dos resultados desastrosos é sempre dos executores, nunca dos autores dos planos. Os planos são sempre muito bons, os executores – governantes mais ou menos tecnocratas com eles sintonizados – é que, por vezes, não têm a "coragem"; necessária para os impor, e às vítimas (ao povo) falta o estoicismo do "custe o que custar"; para aceitarem o desemprego, o trabalho quase escravo, a pobreza e a fome, falta a capacidade para o necessário "sofrimento regenerador";.
Vimos, esta semana, uma sondagem (Universidade Católica) que nos apresenta 62% dos portugueses a considerarem o desempenho do Governo como mau ou muito mau. É a expressão de um sentimento coletivo de necessidade de mudança.
É verdade que, nessa mesma sondagem, os portugueses não reconhecem alternativas de Governo no quadro das forças políticas existentes. Mas, a perceção coletiva do fracasso do caminho seguido é já um primeiro passo que, sustentado numa ação de esclarecimento e mobilização social e política, há de preparar e concretizar as mudanças necessárias, única via que nos pode desviar do rumo da Grécia.