O que vamos vendo, ouvindo e lendo em tempo de férias, com mais disponibilidade para refletir, desafia-nos a assegurar que estamos mesmo com “a cabeça entre as orelhas”, pois vivemos em delicado tempo de absurdos. Precisamos de ter as nossas bases neurológicas espevitadas, de ser cidadãos conscientes e capazes de meter a mão na consciência, de procurar equilíbrio nas emoções e não deixar que elas se dispam de valores éticos ou morais e de princípios a eles associados.
Parece que a aceleração (real e fictícia) de muitas mudanças que vão ocorrendo na sociedade nos está a matar a memória e a capacidade de pensar sobre questões simples. Vendem-nos velharias como novidade e falsos absolutismos do novo.
O papel do circo, na Roma de há dois mil anos, é hoje o de programas (ou espaços de despejo de opiniões) de entretenimento alienante, de promoção de estilos de vida assentes no individualismo e em realidades de nichos apresentadas como universais. Concomitantemente trata-se a política, as vidas pessoais, a pobreza, a miséria e a guerra como espetáculo.
Vai-se normalizando a guerra como realidade inevitável dos novos tempos. A este propósito, observo que nos próximos dias ver-se-á se algo de significativo vai surgir no compromisso que os Estados Unidos da América (EUA) estão (juram que sim) a procurar entre Israel e o Hamas, que justifique designá-lo por “acordo de cessar-fogo”. Muito tardio será sempre, mas pode acrescentar perigos.
As eleições presidenciais nos EUA são, sem dúvida, de grande importância: face ao papel que aquela nação e potência ocupa à escala global; pelas tensões latentes internamente; porque a União Europeia vem acrescentando dependência da sua estratégia e interesses; porque existem múltiplas leituras sobre o papel daquele grande país. Contudo, o que vamos tendo na nossa Comunicação Social são comentadores produzindo, pateticamente, discursos para influenciar o voto, como se fôssemos nós a decidir os resultados daquelas eleições. Por seu lado, os dirigentes da UE lá vão, de brilho nos olhos, criando a falsa expectativa de que virão dali as respostas aos problemas não resolvidos pelas eleições europeias e nacionais.
No último fim de semana, o nosso primeiro-ministro considerou que todos os seus atos de governação são políticas estruturais, estratégicas. De estrutural tem feito pouco porque não tem apoio parlamentar, mas quando pode é classista - veja-se duas medidas na área dos impostos anunciadas para os jovens. O regresso à política do bónus (a esmola) para as pensões mais baixas é contra o direito a vidas dignas e cava mais o fosso das desigualdades. Responder a reivindicações socioprofissionais de professores, polícias, profissionais da Saúde ou da Justiça são necessidades que não podiam ser mais adiadas, mas o Ensino, a Justiça e a Saúde não se transformam sem outros investimentos.