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07-08-2024        A Tarde [BR]

2021 foi o ano em que Agim Sulaj, desenhista albanês radicado em Itália, conquistou o segundo lugar no World Press Cartoon realizado em Caldas da Rainha (Leiria, Portugal) com uma imagem que marcou o início da pandemia da COVID 19: quatro máscaras cirúrgicas a formar o número 2020 (disponível em https://worldpresscartoon.com/winner-2021/). A metamorfose nas relações sociais, até aquele momento, estava apenas a se delinear. Para o artista, no entanto, a revolução já havia acontecido e não trazia bons augúrios.

Uma das marcas distintivas de Sulaj são as malas de cartão. Aquelas de viagem que os emigrantes costumavam levar nas partidas desditosas, mas cheias de esperança de uma Vida melhor. “Um dos ícones de expressão do meu pensamento é a mala, com poucas roupas e muitos sonhos: a casa do emigrante, as vicissitudes das migrações etc. (...) Eu também sou um emigrante. Ao deixar a minha terra, vivenciei as dificuldades de chegar a um país estrangeiro e isso inevitavelmente afeta a arte de alguém (...) A mala é um símbolo importante para mim” (Sulaj, 2024).

Suas linhas impressionam pela delicadeza em que, advinda de um fundo escuro, a mensagem é sutilmente apresentada como uma sátira destes tempos modernos. As malas, sempre de forma contundente, belas e ao mesmo tempo incômodas, estão ali para desnudar uma opressiva realidade. O sistema vigente reconhece os direitos (mesmo que provisoriamente) somente daquelas pessoas que estão inseridas no sistema de produção, distribuição e consumo de mercadorias. Para os demais, os condenados da Terra (como diria Frantz Fanon), resta ficar à sombra da mala e tentar se proteger das intempéries inevitáveis da globalização.

Uma coletânea deste trabalho, intitulado “Migrantes”, pôde ser vista recentemente na Casa Família Oliveira Guimarães (em Vila de Espinhal, Penela). A exposição, com a presença de Sulaj no dia da inauguração, contou com um acervo de “malas” em suas mais curiosas e impactantes figuras. Desde “Afundando em Sonhos (2)”, no qual compartilhamos a angústia de pessoas lutando para sobreviver em um navio abatido pela tempestade (disponível em https://www.agimsulaj.com/Quadri/93.shtml), até o “Malabarista”, que está a atravessar o interior de uma mala suspenso apenas por um longo e estreito fio - como o de Ariadne, para alcançar a liberdade, ou dependente do bom humor das parcas para garantir a travessia (ver AQUI).

Se o humor, no sentido grego do termo, serve para questionar o cotidiano, quiçá possa indicar caminhos para conquistar o tão distante bem-estar da sociedade. Assim, entre malas e migrações, acredita Agim Sulaj.


 
 
pessoas
Antonio Carlos Silva



 
temas
agim sulaj    migrações    modernidade