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02-03-2024        Jornal de Notícias

Neste tempo de eleições, em que as pessoas valem muito porque é preciso conquistar-lhes o voto, não sejamos nós (cada cidadão) a desvalorizarmo-nos pela não comparência nas urnas, ou por não fazermos um necessário exercício de memória. Nas cinco décadas de democracia, Portugal podia e devia ter conseguido um maior desenvolvimento humano e social, económico, cultural e político.

Devíamos ter menos pobreza, melhores salários com a efetivação da negociação coletiva e melhores pensões, maior produtividade com horários de trabalho mais reduzidos, habitação digna para todos, menos jovens a emigrar, melhor saúde, uma escola mais avançada, menos promiscuidade nos negócios público/privados, melhor justiça. Como se posicionou cada partido perante as decisões que geraram avanços ou recuos em cada uma destas matérias? Em 2012, em nome de que vivíamos acima das nossas possibilidades, foram feitos cortes nas retribuições e direitos dos trabalhadores correspondentes a três mil milhões de euros por ano. Quem assume reparar este roubo?

Entretanto, os novos protagonistas relevantes no processo eleitoral em curso são velharias ultraconservadoras e fascistas que aproveitam contradições e tensões geradas pelo ultraliberalismo e pelo belicismo, hoje em marcha, para imporem retrocessos.

Nos debates organizados pelas televisões, não foi promovida a discussão dos reais problemas com que os portugueses se debatem, nem se questionou o que significa estar contra o regime. O foco foi o patético comentário que se lhes seguiu, sobre quem ganhou e quem perdeu.

O Chega afirma-se contra o regime político nascido do 25 de Abril, a democracia.  Quanta memória se perdeu para haver quem esteja a dar crédito aos que acham que Portugal podia continuar a ser um país colonizador, com total ausência de direitos, liberdades e garantias, sacrificando a juventude, isolado do Mundo, sem Estado social e sem direitos laborais!

Nas décadas de 60 e 70 do século passado, centenas de milhares de portugueses emigraram, sem contrato de trabalho ou documentação legal, para fugirem à miséria. Teriam sido “recambiados” para Portugal (muitos para as prisões), se os países que os acolheram adotassem as políticas que Ventura propõe agora para a imigração. Salazar, em nome do seu “caráter austero”, das contas “certinhas”, da sua não contaminação pelos negócios, utilizou o Estado para colocar sete famílias a dominar toda a economia portuguesa. E criou um regime em guerra permanente com a esmagadora maioria do povo português. É o que Ventura quer ressuscitar, colocando a sua “gente de bem”, contra o povo que não abdica da democracia, da igualdade, da dignidade para todos.

A Iniciativa Liberal e de forma mais moderada a AD fazem uma berraria contra o Estado, o culpado de todos os males, até de maus comportamentos de privados. O Estado é ubíquo na organização da sociedade. Só se não estivesse presente daríamos pela sua falta. Todos os dias utilizamos a água, o gás, o sistema de esgotos, as ruas e estradas, sistemas de mobilidade, de comunicação e segurança, que o Estado com os nossos impostos assegura. Alguma vez se teria criado o Serviço Nacional de Saúde de acesso para todos, ou a Escola universalizada, por investimento da iniciativa privada?

O voto, em consciência e livre, é sempre ganho. Talvez seja bom dar o voto a forças que têm lastro consistente em áreas como a do trabalho e dos direitos fundamentais, que estão muito debaixo de fogo. Não abdiquemos de um bom exercício de memória. 


 
 
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Manuel Carvalho da Silva



 
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