Com a evolução demográfica e os ganhos conquistados pelo sistema educativo nas últimas décadas, Portugal entrou numa fase nova com repercussões significativas no “mercado de trabalho”. A força de trabalho nacional pode diminuir, mas tem mais educação e formação e muito maior potencial de qualificação profissional. A resposta às justas aspirações dos nossos jovens e o aproveitamento das suas capacidades a favor dos interesses de toda a sociedade exigem a criação de emprego mais qualificado e valorizado. Em grande medida não estamos a ir nesse sentido.
Parece projetar-se para o futuro a via alternativa: o modelo dos baixos salários alimentado por contingentes massivos de imigrantes, cujas dependências os colocam em condições de sujeição a salários baixos. A eles juntam-se os jovens portugueses que tentam a todo o custo não emigrar. O total de jovens licenciados que faz parte do conjunto de trabalhadores não qualificados não pára de crescer. Muitas vezes, patrões e governantes que nos dizem andar à procura de “talento” andam somente à pesca de quem tem qualificações, mas não pode fugir à sujeição ao baixo salário.
A relação entre o perfil de especialização da economia e a qualidade do emprego e das profissões é total e recíproca. A persistência de setores de atividade de baixo valor acrescentado não potencia a criação de emprego de qualidade nem gera (com exceção de pequenos nichos) profissões valorizadas. A aposta na industrialização é adiada ou até contrariada. A entrega da Efacec a um fundo financeiro é um triste exemplo. Todavia o que está em marcha com a utilização do sol (restringida à exportação de turismo barato), do hidrogénio e até do lítio é mais revoltante. Num seguidismo pleno das políticas da União Europeia, abstemo-nos de tomar posse e de gerir os nossos recursos naturais.
Em Sines, prepara-se, com interesses estrangeiros, a produção de hidrogénio com dois destinos: uma boa parte será utilizada para alimentar a central de dados, que tem um enorme consumo de energia; e a outra parte parece encaminhar-se para exportação. São estes projetos que vão transformar qualitativamente o emprego e as profissões? Não. Todavia, se a energia produzida e armazenada a baixo custo fosse colocada ao serviço das empresas para modernizarmos a indústria e fosse disponibilizada às populações, teríamos uma oportunidade para irmos transformando positivamente a nossa matriz de desenvolvimento.
O discurso empresarial dominante deixou de se referir a trabalhadores e também, em grande medida, a profissões concretas. Reclamam “colaboradores” o mais polivalentes possível e de preferência, precários. Ora, as profissões definem-se, estruturam-se e valorizam-se no trabalho e no emprego; não se confundem com outras ocupações. A profissão é uma ocupação especial, que incorpora vocação (natural e trabalhada), e sempre, valores sociais, éticos, culturais, códigos deontológicos e conhecimentos específicos. E exigem contextualização nas relações de poder.
Na Escola - no Ensino Superior em particular - hoje, o grande foco é tornar cada jovem um “empreendedor”, numa perspetiva fechada e individualista. Ignora-se a observação de que nunca houve tanto emprego, nomeadamente por conta de outrem, como atualmente. Não se preparam os jovens para a perceção das profissões. No momento em que estas estão em reformulação profunda e muitas a nascer, as universidades abandonaram a sociologia das profissões. Mais uma consequência do alastramento do neoliberalismo.