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12-08-2023        Jornal de Notícias

Os dados sobre o emprego e o desemprego, divulgados esta semana pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), relativos ao segundo trimestre de 2023, levaram o Governo, em particular pela voz do Secretário de Estado do Trabalho (SE), a fazer cinco afirmações cheias de positivismo, a merecer aferição cuidada: i) a taxa de desemprego diminuiu, é agora 6,1%; ii) atingiu-se o recorde de população empregada, quase 5 milhões de pessoas; iii) “mais de 91% do emprego criado em Portugal, desde 2019, foi fora do Estado”; iv) em 2023, “os ganhos salariais são reais”; v) o valor das exportações de alta tecnologia é o mais elevado desde 2013, pode indiciar “um novo paradigma económico”.

Primeiro, o desemprego desceu, comparado com o trimestre anterior, mas aumentou face ao trimestre homólogo de 2022. Temos 324 500 pessoas registadas como desempregadas e há outras não registadas. O fator que mais contribuiu para diminuir o desemprego neste período foi a celebração de quase 55 000 contratos sazonais. É positivo haver mais trabalho, mas como a generalidade destas pessoas não sobreviverá com o que vai auferir nuns meses, teremos mais encargos para a Segurança Social e mais cidadãos a viver de apoios pontuais, por não terem acesso ao subsídio de desemprego.

Segundo, a criação de emprego concentrou-se no turismo e construção, setores de baixa produtividade, muita precariedade e baixos salários. O aumento da população ativa está a ser feito pela imigração - sem dúvida bem-vinda -, mas as suas condições de fragilidade alimentam a desvalorização salarial. E, não se pode explicar a perda de trabalhadores com licenciatura ou mais, apenas por uma alteração metodológica do INE na recolha de informação. Consciencializemo-nos de que estamos a atingir saturação no turismo. A construção é mais transformação de habitação para atividade turística, que resposta aos problemas do setor. Precisamos de tratar melhor os imigrantes e diminuir a emigração.

Terceiro, quando o SE, para valorizar o setor privado na criação de emprego, realça ter sido este o motor do emprego, põe a nu um dos graves défices das políticas deste governo: a falta de contratação de trabalhadores qualificados e altamente qualificados em várias áreas do Estado, designadamente, na saúde, na educação, na justiça. Enfraquece a prestação de direitos fundamentais e é mau exemplo para o privado.

Quarto, estamos a assistir a sinais de uma ténue recuperação salarial, todavia longe de cobrir as perdas dos últimos anos, ou seja, não se poder falar de mudança na política salarial. Por causas que vão dos impactos da inflação à especulação em setores chave, os salários têm hoje menor poder de compra, e minguaram os rendimentos disponíveis.

Quinto, a exportação de produtos com mais conteúdo tecnológico não significa automaticamente melhoria da qualidade do emprego e, menos ainda, mudança de “paradigma” da economia. Depende do que foi importado e do que foi incorporado no plano nacional, nos produtos exportados. Estude-se o que se passa realmente.

No passado empurraram-se trabalhadores mais velhos para o desemprego e a pré-reforma, para “darem lugar aos jovens com níveis escolares mais elevados”. Em inúmeros casos tratou-se apenas de uma operação para eliminar direitos e salários. O emprego continuou pouco qualificado e mais precário. Também sabemos que a aposta (importantíssima) no ensino e na formação profissional não resolve, por si, a qualidade do “mercado de trabalho”. São necessárias políticas que apostem simultaneamente nas pessoas e no perfil de especialização da economia.


 
 
pessoas
Manuel Carvalho da Silva



 
temas
emprego    economia    desemprego