Nova Iorque, para além do Central Park e da Broadway, tem como um dos seus símbolos o “The New York Times” (NYT). Fundado em 1851, o jornal se destaca pelo sério compromisso com a busca incansável da verdade. O que lhe rendeu 135 prêmios Pullitzer - o mais conceituado na área de jornalismo investigativo - ao longo de 172 anos de história. Em maio último, em pleno encontro do G7 no Japão, três notícias - aparentemente sem qualquer relação – revelaram a perspicácia do jornal em apontar as contradições dos “donos do poder” para manter os debilitados fundamentos do atual sistema. A primeira descreve a pauta do encontro: a guerra na Ucrânia e a preocupação com a influência (cada vez maior) da China no cenário internacional. As outras duas, com discrição na abordagem, lançaram as sementes para uma leitura mais acurada do conceito de “Ordem Mundial” em pleno século XXI.
O jornal estabelece, neste contexto, a conexão entre a revisão do orçamento norte-americano dedicado ao auxílio militar na Ucrânia (previsto em UR$ 3 bilhões) e a retomada da cidade de Bakhmut, até então sob domínio russo, como parte da contra-ofensiva do governo Volodymyr Zelensky.
O importante a compreender aqui é que, se até a derrocada da ex-URSS (em 1991) o que estava em jogo era a conquista territorial para atender interesses nacionais de poder/influência, no século XXI a “nova guerra” nas portas do Cáucaso se apresenta como fenômeno vinculado à reorientação das estruturas de proteção do modo de produção (agora unificado) do mercado mundial. Independente das tendências social-democratas, liberais, extremistas, fundamentalistas ou afins, pois são todas resultantes do próprio desenvolvimento irracional da modernização capitalista. O que incorre na dependência dos Estados (países em desenvolvimento) de apoio militar externo que, em nome dos direitos humanos e da defesa da democracia, debilita ainda mais as finanças públicas dos países invadidos (ou será despossuídos?).
É o que está a passar na Ucrânia, tal como ocorreu no Afeganistão, Iraque e Síria (para citarmos os eventos mais recentes). Com uma particularidade, a desterritorialização em jogo afeta a estratégia energética européia e fomenta o ressurgimento de um espectro (aparentemente) esquecido no xadrez global: a OTAN. O que resulta no protagonismo chinês para, em sutil embate com os Estados Unidos, redefinir as regras da economia política da guerra. Com uma certeza, aqui em consonância com as notícias do NYT. Nós sabemos quem pagará a conta desta remodelagem no tabuleiro capitalista. Afinal, neste afã desmedido, “enquanto a crise deixa cada um por si, mas todo mundo na lona, está cada vez mais down, down in the high society” (Rita Lee).