Está em curso um debate no espaço público sobre migrações para Portugal e integração de imigrantes no país. É um debate importante para o nosso futuro comum. Precisamos de imigrantes como mão-de-obra para a boca. Sem um fluxo de entrada de novos ativos no mercado de trabalho nacional, a população ativa tenderá a envelhecer e a deixar de ser eficaz em suprir as necessidades económicas do país. Mas, agora que existe um consenso nacional sobre a pertinência e a necessidade de acolhermos imigrantes, temos que perceber se o estamos a fazer de forma minimamente aceitável. A resposta é clara e simples. Não estamos!
Porque falhamos, quando falhamos, onde falhamos?
1. A Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, continua a responder ao pressuposto de promover a atração de imigrantes, através dos canais de imigração legais (ao contrário do que acontece em muitos países). Em Portugal haverá umas centenas de milhares de migrantes em processo de regularização, mas muito poucos que tenham entrado em território nacional de forma ilegal. A lei, neste particular, funciona e as alternativas propostas abririam portas para uma imigração ilegal, mais tráfico humano e, nunca, ao fim da imigração.
2. O problema é que o sistema se torna disfuncional após a entrada de potenciais imigrantes em território nacional. Disfuncional, quando o migrante se quer regularizar e não consegue, porque os serviços não dão resposta à quantidade de pedidos de autorização de residência e aos requisitos de verificação e segurança contidos na legislação para a sua atribuição (e estes últimos não podem/devem ser suplantados de forma simplista). Nos últimos anos formou-se a tempestade perfeita nesta etapa do sistema de imigração: muito mais pedidos, menos recursos, menor capacidade de envolver os agentes do Estado no cumprimento da sua missão. Não é alheia a esta confusão a estratégia de restruturação do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) com os seus parcos avanços e estrondosos recuos, mas, sejamos honestos, o sistema já não funcionava há muito.
3. Num terceiro momento, o sistema de imigração, agora também sistema de integração, volta a falhar. O Alto Comissariado para as Migrações (ACM) não tem agentes ou técnicos no terreno, não tem capilaridade territorial nacional, não tem estrutura que possa organizar a integração social dos imigrantes. De uma boa ideia de há duas décadas chegámos a um impasse na sua missão. Atualmente, pouco ou nada contribui para uma integração dos imigrantes em nenhuma das áreas vitais: mercado de trabalho, habitação, educação ou saúde. É pena.
4. O mercado de trabalho, num momento de quase pleno emprego, anseia por mais e mais trabalhadores e é hoje a carta de chamada mais importante (não são os vistos). Porém, uma estratégia de baixos salários, de exploração laboral e de rotação de mão-de-obra, torna impossível uma integração social para muitos imigrantes. Com parcos rendimentos ficam incapazes de aceder a uma habitação digna, à saúde ou educação e até de aceder ao reagrupamento familiar. Podem até conseguir regularizar o seu estatuto migratório, mas não são capazes de normalizar as suas vidas. Com salários de miséria, a exclusão social destes imigrantes é uma certeza e o seu contributo para a sociedade portuguesa bem menor que o seu potencial.
5. Cumprir a promessa de integração social dos imigrantes na sociedade portuguesa é bem mais do que restruturar o SEF ou, ainda mais importante, refundar o ACM. Requer visão e liderança política para desenhar um novo modelo, com novas estruturas capazes de garantir a coordenação e articulação eficaz entre os vários agentes institucionais e a sociedade civil. Requer novos recursos, a mobilização do conhecimento existente, a partilha de boas práticas, diálogo e um consenso político alargado. Enfim, tudo o que estamos a atirar borda fora com a simplificação e radicalização da governação das migrações nas últimas mediáticas semanas.