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21-01-2023        A Tarde [BR]

Consoante Robert Kurz, o debate sobre a crise mundial foi reduzido às intrigas subjetivas e o seu discurso ao princípio reducionista comum. Portanto, a crítica da economia política perdeu relevância e as proposições teóricas tornaram-se contraproducentes para apreensão da questão social.

Destarte, a receita para o êxito infinito está na reconfiguração do pensamento individual para superar as agruras deste sistema voltado à exploração. O problema, entretanto, é que a partir de meados do anos 1980, com a 3ª. Revolução Industrial, a maioria da população mundial atingiu outro patamar: o da exclusão da sociedade produtora de mercadorias. Ser explorado e poder manter-se vivo na esfera da produção, afirma Kurz, é um privilégio se considerarmos a quantidade impressionante de pessoas que vive às margens do processo de circulação e distribuição do capital. Os milhões de desempregados em situação permanente e os beneficiários em exponencial dos programas estatais de apoio social.

O ensaísta alemão não está isolado nesta análise. Barbara Ehrenreich, ativista e autora de “Miséria à americana” (2001), revigora a crítica ao culturalismo redutor que busca dissimular os alicerces corróidos do sistema capitalista através da ideologia do pensamento positivo.

Para autora norte-americana, a fragilidade do culto ao pensamento positivo está na recriminação do per se. Os sérios problemas étnicos, raciais, territoriais e de gênero não são compreendidos no capitalismo como contradições inerentes do próprio sistema. Tornam-se, na miopia excludente, um óbice pessoal. “Se você pensa que seus problemas se devem à discriminação racial ou ao fato de ter nascido pobre, isso não passa de uma desculpa, porque você tem tudo para ser bem sucedido e superar qualquer coisa” (Enrenreich, 2009). Pensar positivo é, na terminologia capitalista, um grande negócio para sustentar a falência do sistema e manter os excluídos inconscientes da sua cruel realidade: “no interior do sistema produtor de mercadorias, só há a diferença quantitativa que, se existencialmente toca na questão da sobrevivência, não obstante permanece estéril em termos emancipadores” (KURZ, 2004).

Essa “nobre mentira” está presente no discurso de todos aqueles que sob o manto do mercado mundial - Elon Musk, Jeff Bezos, Mark Zuckerberg etc. - subvertem a proposição platônica e apostam na autovalorização para fomentar o êxito pessoal. Afinal, sem a compreensão dialética de que atitudes individuais podem estar em conflito com o bem estar dos Outros, o nosso devir histórico será a globalização da barbárie sem fim, tal como retratada em “Nomadland” (Jessica Bruder, 2020) e “Eu, Daniel Blake” (Ken Loach, 2016). Isso se pensarmos positivo.


 
 
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Antonio Carlos Silva



 
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