No início da madrugada de segunda-feira saberemos quem será o próximo presidente da República do Brasil, país com o dobro da superfície da União Europeia e bastantes recursos naturais, o sexto mais populoso do Mundo, a 12.ª maior economia.
O Brasil é relevante nas mudanças geopolíticas em curso à escala global e será, seguramente, influente na nova era que já começou. Era essa onde grandes países europeus terão um papel secundário. O contexto histórico que forjou partilha comum da língua, de relações culturais, sociais e económicas, de que é preciso tratar com empenho, reforça a necessidade de estarmos atentos.
O que está em confronto nestas eleições no Brasil? São duas opções económicas? São as personalidades de Jair Bolsonaro e de Lula da Silva? Bolsonaro quer mesmo combater a corrupção? O PT e seus aliados, se vencedores, conseguirão combatê-la com êxito, tão entranhada ela está no sistema político? Por que razão a campanha eleitoral se tem desenvolvido num clima tão crispado, cheio de insultos, de desinformação, de ódio? Afinal não será que o confronto é mesmo em torno de modelos de sociedade e de valores civilizacionais?
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Deitando mão dos resultados da 1.a volta, das linhas programáticas que fomos conhecendo e das estratégias eleitorais das candidaturas e, até, de comentários de rua que a Comunicação Social nos vai transmitindo, é inequívoco que o confronto é bem mais que entre modelos económicos: é mesmo em torno do modelo de sociedade, num contexto em que o neoliberalismo procura consolidar posições à escala global. O neoliberalismo e a economia financeirizada que o integra têm exigências económicas e sociais só exequíveis com a presença de forças reacionárias e fascistas nos altos cargos do poder.
O insulto e o ódio disseminaram-se, embora em doses bem diferentes em cada uma das candidaturas, mas não nasceram agora. Recuemos somente ao processo de impeachment de Dilma Rousseff: a justificação da tortura foi apenas uma das imensas barbaridades afirmadas pelos vencedores, que aí começaram a moldar o bolsonarismo.
Quando, nas presidenciais anteriores, líderes políticos de setores democráticos do Centro e da Direita não tiveram coragem de se posicionar contra Bolsonaro - felizmente agora tomam partido - facilitaram o avanço do projeto retrógrado que ele corporiza. Hoje, existe a esperança de a Esquerda mais o Centro e alguns setores da Direita serem vencedores com a candidatura de Lula, porque este, apesar das suas fraquezas, tem uma força e coragem admiráveis, e porque grande parte do povo brasileiro não desistiu da luta.
Bolsonaro na presidência perverteu valores republicanos e democráticos. Promoveu a criminalização das diferenças de opinião e a liquidação de opositores, acusando as vítimas de se porem a jeito. Incentivou o belicismo, o racismo, o ódio às diferenças na sexualidade e a misoginia, num país de enorme diversidade cultural e étnica. Defendeu políticas de educação e de saúde que negam a ciência, foi um desastre para o ambiente. Ele representa as classes privilegiadas que querem a institucionalização das desigualdades. Defende, como as igrejas/negócio que o apoiam, que o sucesso económico é escolha de Deus.
Amanhã no Brasil é possível uma vitória política que, no imediato, vença o medo, trave o fascismo e abra portas à construção da esperança.