Estamos a viver um estio de duras securas e incêndios em vários campos, desde o climático ao da governação global, europeia e nacional. Este é, provavelmente, o ano em que mais sentimos a gravidade dos problemas climáticos e ambientais. Pensar nos desafios que se colocam às gerações jovens assusta. Todavia, existem meios tecnológicos e científicos que, investidos numa equilibrada relação metabólica Homem/Sociedade/Natureza, podem trazer algumas soluções.
É possível mudar a organização dos territórios e espaços de habitação, corrigir estilos de vida, utilizar riqueza existente para proteger povos e países em situações mais frágeis. Não podemos ficar tolhidos pelo medo.
Nas movimentações dos países e blocos que determinam as relações à escala global, os incendiários belicistas dominam como já não acontecia há muito tempo. E é grande a secura de ideias e de propostas para a construção de caminhos seguros. A imposição de uma visão dicotómica do Mundo e da necessidade de "guerras justas" - doutrina agora reforçada no nosso Ocidente - ajudam a bloquear soluções.
Na governação da União Europeia (UE) e dos países que a compõem, encontra-se o retrato que José Saramago fazia, em 1998, ao receber o Prémio Nobel: "Alguém não anda a cumprir o seu dever. Não andam a cumpri-lo os governos, seja porque não sabem, seja porque não podem, seja porque não lho permitem os que efetivamente governam, as empresas multinacionais e pluricontinentais cujo poder absolutamente não democrático reduziu a uma casca sem conteúdo o que ainda restava de ideal da democracia". Perante esta constatação, Saramago sugeria-nos assumirmos "o dever dos nossos deveres". O dever de não desistirmos das pequenas/grandes utopias e de nos responsabilizarmos como cidadão plenos.
O nosso Governo não faz tudo mal e está perante grandes problemas internos e externos. Mas, por vezes, parece ter uma atração pelo cair de maduro. Ao persistir em velhas políticas - de génese nacional ou europeia - e em mobilizar a Direita para as credibilizar em vez de forçar discussões de substância sobre novas soluções, desgasta-se. Deixa o campo aberto a polémicas estéreis. A Direita critica a obsessão do défice, não para que haja investimento onde ele é indispensável, mas sim para que o reforço momentâneo dos recursos do Estado desague nos mesmos de sempre. Para os trabalhadores e setores desprotegidos da população só tem o "programa de emergência social" - o velho assistencialismo caritativo.
Os problemas estruturais do país não são novos, nem exigem um elevado "grau de inovação e radicalidade". Exigem sim, do Governo, coerência e determinação para: i) pôr de lado o fundamentalismo orçamental (sem deixar de dar atenção ao défice) e garantir investimento; ii) abandonar o relacionamento doentio com empresários da pedinchice e das negociatas, substituindo as "ajudas" que lhes vem oferecendo por apoios escrutináveis e com contrapartidas; iii) ultrapassar contradições que manifesta sobre o papel determinante do Estado e das Administrações Públicas; iv) apostar na segurança no emprego e em melhorar os salários; v) contrariar a ação do presidente da República na sua errada postura de sabichão máximo de todos os assuntos, pois a cidadania e a democracia não dispensam a plena afirmação de interesses coletivos e a responsabilização das instituições de intermediação da sociedade.
Há pequenas utopias realizáveis. Lutando por elas venceremos medos e forçaremos alternativas.