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24-04-2022        Jornal de Notícias

Com grande frequência, os nossos governantes e outras entidades classificam a geração que vem concluindo o seu percurso educativo e que está - ou devia estar - a entrar no mundo do trabalho como "a geração mais qualificada de sempre".

Tal narrativa tem dimensões de sustentação que importa realçar pelo acerto de políticas seguidas e pelas apostas das famílias portuguesas na educação e formação. Mas, por outro lado, oculta contradições que acabam por diminuir, ou até anular, o potencial para o desenvolvimento do país que aquela afirmação pretende significar.

"A geração mais qualificada de sempre" choca frontalmente com uma estrutura produtiva assente em setores de baixo valor acrescentado, relações de trabalho desequilibradas e marcadas pela imposição unilateral do poder patronal, num quadro geral de desvalorização (material e simbólica) do trabalho. Na Administração pública a situação é idêntica. O resultado é um desemprego elevado nesta geração, a emigração em larga escala, o fenómeno perverso de estarmos a formar para os países ricos do "centro". Muitos jovens dão por adquirido que para terem a vida que anseiam terão de emigrar. É preocupante.

Durante anos e anos, temos tido políticas de emprego que enfocam o lado da oferta, no pressuposto errado de que os problemas da economia e do desenvolvimento do país se resolvem a partir da aquisição individual de "competências". São indispensáveis políticas estratégicas e investimento na criação de emprego, salvaguarda de direitos fundamentais no trabalho, definição e afirmação de perfis e carreiras profissionais em quase todos os tipos de emprego, muito maior atenção às políticas de mobilidade, de habitação, de coesão territorial.

A educação e a formação, sendo absolutamente indispensáveis, não são suficientes e é criminoso remeter para o universo dos "desqualificados" os jovens que só façam o ensino obrigatório. O saber fazer tem de estar presente em todos os níveis da escola. É preciso combater a mercadorização do Ensino Superior e da Ciência, cujo subfinanciamento favorece as clivagens de classe e territoriais dentro daquela geração.

As capacitações necessárias para o trabalho e o emprego no futuro são bem mais amplas que uma boa manipulação de teclados associada ao "mito da automação" e a outros determinismos tecnológicos, que conduzem ao desperdício de competências e formações. E o investimento em processos ricos de formação e de aprendizagem nos locais de trabalho pode valorizar projetos educativos menos longos, desde que propiciadores de formações ao longo da vida.

Faltam políticas industriais que puxem pelas potencialidades de diversos setores, contrariando o caminho que tem sido seguido, assente, sobretudo, em políticas reativas a procuras internacionais. Portugal carece dos parâmetros gerais de um projeto de desenvolvimento, da priorização de políticas que favoreçam o investimento, da modernização e capacitação da Administração Pública. Será preciso qualificar a gestão e a organização do trabalho nas empresas. Só assim se descobrem, evidenciam e potenciam as competências dos trabalhadores.?

Em 25 de Abril de 1974 havia um défice colossal de educação, formação e qualificações. Vencemos esse bloqueio assegurando bases para um avanço civilizacional. Não borreguemos desaproveitando essa conquista.


 
 
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Manuel Carvalho da Silva



 
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