A estabilidade é um conceito sempre no cerne do debate político. Trata-se de um requisito reclamado por qualquer governante para “bem governar” e os cidadãos anseiam políticas que lhes propiciem uma vida estável e segura. São estes dois pressupostos que António Costa afirma como justificação das eleições legislativas de 30 de janeiro. Rui Rio, igualmente pregador da estabilidade, acha que aquilo que instabiliza as nossas vidas é “termos tanto socialismo em cima de nós”, propondo-se “fazer diferente”, como se fazer diferente signifique fazer melhor.
Rui Rio, a custo, passou a ser pela valorização do Salário Mínimo Nacional, mas logo descobriu (grande patranha) que o “crescimento excessivo” do SMN impediu a melhoria dos outros salários. Assim, a sua política diferente consistirá em travar o crescimento do SMN para “melhorar a mediana salarial”, garantir às empresas condições de crescimento e obtenção de ganhos para “depois distribuir”, acrescentando, hipocritamente, que se as coisas correrem bem, “um salário mínimo de 900 euros até pode ser pouco”. São receitas do século XIX.
O crescimento geral dos salários exige salários mínimos dignos, relações de trabalho equilibrados e exercício pleno da negociação coletiva. Esta, deve ser a sede onde se tratam, em simultâneo, os compromissos de produção e de retribuição com quem produz a riqueza. Promessas de melhoria de salários sem resolução destes problemas são acrescentos de instabilidade na vida dos trabalhadores e suas famílias.
Rui Rio reconhece que será perigoso colocar os sistemas de segurança social nas políticas de casino, mas para acompanhar a modernidade neoliberal quer sistemas mistos que entreguem uma parte das contribuições a fundos especuladores. As propostas “diferentes” de Rio para garantir direitos sociais fundamentais, como a saúde, a educação e formação, ou ainda, para lidar com prejuízos de empresas públicas, resumem-se à transferência de recursos públicos para os privados e à crença, provadamente mentirosa, de que o negócio tudo resolve.
António Costa, por seu lado, tenta convencer-nos de que a sua proposta de Orçamento para 2022 contem as mais eficazes propostas de políticas que nos hão de conduzir ao paraíso. Todavia, é fácil identificar insuficiências e contradições na relação entre o económico e o social, nos apoios ao setor privado, no trabalho e emprego, no ensino, na ciência e na cultura.
António Costa governou com estabilidade, referida por ele como trabalhosa, mas funcional. Entretanto, no debate com Rui Rio enunciou três tortuosas soluções para uma governação estável: conquistar uma maioria absoluta, que toda a vida considerou perniciosa pelo autoritarismo que induz; formar uma maioria com o PAN e outros restos; governar com o consentimento do PSD. Que estabilidade trazem estas soluções?
Em próximo artigo tentarei percecionar as opções de António Costa em cinco momentos. I) a disponibilidade, em 2015, para liderar um governo com apoio parlamentar de toda a esquerda, não sendo o PS o partido mais votado; ii) o seu empenho na execução de compromissos mínimos assumidos com os aliados no início da primeira legislatura, a que se seguiu mais de um ano a empurrar problemas com a barriga; iii) a fuga a compromissos escritos em 2019; iv) a não remodelação governamental quando a incapacidade de alguns governantes era evidente; v) os atrasos na negociação do Orçamento e início da colocação dos aliados como não confiáveis.