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11-12-2021        Jornal de Notícias

Não é verdade, mas por vezes parece que a hipocrisia e a maldade humanas não têm limites. Quando observamos as profundas desigualdades e injustiças com que se tratam os países e os povos na gestão da pandemia, a secundarização dos impactos das alterações climáticas e ambientais, a contínua pregação do medo como forma de submeter as pessoas, vemos o mundo a tornar-se insustentavelmente cruel.   

Esta semana a UNICEF, Agência das Nações Unidas para a Infância, disse-nos que “A COVID-19 afetou as crianças numa escala sem precedentes, tornando-se a pior crise a que a UNICEF assistiu nos seus 75 anos de história”. Temos agora “mais 100 milhões de crianças a viver em situação de pobreza multidimensional”, ou seja, sofrendo de uma ou várias privações: fome, nutrição desadequada, falta da prestação de serviços essenciais, ausência de cuidados gerais de saúde e de bem-estar mental, inexistência de Escola e de condições de educação, trabalho infantil, abusos de diverso tipo, inclusive casamento forçado.

Segundo a UNICEF, a situação continuará a piorar em resultado da pandemia, provocando o retrocesso de uma década e, o lema “primeiro as crianças”, nunca “foi tão critico como hoje”. Dos pouco mais de dois mil milhões de crianças que temos no plano global, “426 milhões vivem em zonas de conflitos” que estão a agravar-se, e “mil milhões” - quase metade das crianças do mundo – estão em países que correm “altíssimo risco”, por efeito das alterações climáticas. Esta vergonhosa realidade não pode ser notícia do dia e logo esquecida. Exigem-se políticas públicas que ataquem as origens deste drama, uma forte ação solidária em vários patamares, a responsabilização de todos os poderes e dos cidadãos. Não é tempo de paninhos quentes.

Perante situações de miséria e de exploração humana, deparamo-nos amiúde com opiniões de “instalados na vida” proclamando que “todos gostaríamos que assim não fosse”. Trata-se de um exercício de hipocrisia. Quando surgiu a Covid 19 disse-se - com douta sabedoria e lato consenso -  que estávamos perante “uma pandemia democrática”, pois atingia todos de forma igual. Essa mentira serviu para esconder injustiças desde a primeira hora patentes nas políticas que iam sendo adotadas. 

Os países com o Estado organizado e capacitado para agir, garantiram (e continuam a garantir) muita mais proteção aos seus cidadãos que os outros que não têm um Estado a funcionar em pleno. Mas mesmo nos primeiros vimos os trabalhadores precários, as mulheres, as crianças e os mais pobres a sofrerem mais. Os cofres dos Estados dos países com recursos foram em socorro das pessoas e das empresas, com aplauso de todos os liberais. Todavia, os grandes potentados económicos e financeiros de várias áreas promoveram negócios escandalosos, apoderaram-se, em pouco tempo, de fortunas colossais, sugando indiscriminadamente. Os números divulgados pela UNICEF confirmam que é preciso a miséria de milhões para criar um muito rico.
Vivemos num mundo com organismos mundiais estruturados, como as Nações Unidas, temos direitos e deveres universais reconhecidos, nomeadamente a Carta dos Direitos Humanos que ontem completou 73 anos de existência, mas basta abrir-se uma pequena brecha e o sistema político e económico dominante logo nos vem mostrar que com ele não há direitos irreversíveis e que a justiça e a igualdade são meras ilusões.  O egoísmo e a crueldade humana são perigosamente deixados á rédea solta.


 
 
pessoas
Manuel Carvalho da Silva



 
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