A política é sempre um exercício de escolhas, que se querem percetíveis, ao serviço dos cidadãos e da comunidade, mobilizadoras das capacidades de ação de que a sociedade dispõe.
Hoje, deparamo-nos com fortes fatores de mudança e com duros impactos sociais e económicos provocados pela pandemia. Contudo, os atores políticos fundamentais continuam a invocar imperativos da cartilha neoliberal a que se afeiçoaram, para nos dizerem que não têm as condições e a liberdade necessárias para adotarem as políticas que melhor serviriam os cidadãos e o bem comum.
Que escolhas se preparam para fazer os dirigentes do Partido Socialista e o seu Governo neste exigente quadro? Para onde caminha o Governo, limitado pela fraca capacidade política de um conjunto dos seus membros, parte dos quais evidencia (por causas objetivas ou não) sintomas de burnout? Como se vai revitalizar a máquina da Administração onde se notam, por múltiplas razões, sinais de paralisia? Que estratégias congemina o primeiro-ministro (alcunhado de tático) quando as escolhas necessárias são profundamente estratégicas?
A UE das políticas articuladas, solidárias, de coesão social de que os nossos governantes - e a Direita - nos falam não existe, como provam a gestão do processo de vacinação, a novela das bazucas, as humilhações nas relações internacionais perante os Estados Unidos ou a Turquia. Essa "Europa" que povoa as nossas mentes provavelmente não passou de sonho e estamos longe de saber o que nos espera. A exercitação do músculo que a União vem fazendo, através dos Planos de Recuperação e Resiliência (PRR), não passa, até agora, de um entretenimento, talvez à espera de toda a carga de condicionalismos que lhes vão juntar. E as regras orçamentais, tão duras e injustas para países como o nosso, só estão suspensas. O Governo enreda-se ainda mais nesse caminho errático, prossegue políticas orçamentais de poupadinho que não permitem proteger devidamente as pessoas e as empresas, continuando à espera dos milagres de Bruxelas? O PRR português, dependente de meios e condições ainda desconhecidas, aponta algumas escolhas acertadas, mas tem ausências imperdoáveis e está muito longe de ser resposta aos desafios que se colocam à economia e ao país.
Quando mergulhamos na análise do "Livro Verde Sobre o Futuro do Trabalho" vemos uma efabulação sobre a realidade portuguesa. Com todo o respeito pelos seus autores, direi que se lhes pode perdoar a cedência a determinismos tecnológicos em moda, mas as tecnologias, por um lado, têm transversalidade na estrutura e organização da economia, do Estado, da vida das pessoas, por outro, têm exigências específicas de especialização. A maior parte do trabalho de hoje, nos diversos setores de atividade ou na Administração Pública Central e Local, embora sujeito a alterações nas suas formas de organização e prestação e a acertos nas profissões, vai fazer parte do trabalho que teremos no futuro. Não pode ficar de fora de um real Livro Verde.
António Costa optará por ir aos desafios difíceis, mas necessários, escolhendo os parceiros adequados, ou aproveita a fraqueza da Direita - que nem a ressurreição de Passos Coelho torna alternativa - e cede à tentação de marginalizar a Esquerda na miragem de uma maioria absoluta? Se fizer essa escolha será desastroso, quer ganhe quer perca.