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30-01-2021        Jornal de Notícias

O cenário político que vivemos é marcado por um movimento tectónico de perigoso deslize para a direita. A Direita acelera o distanciamento do Presidente da República (PR), embora este não se canse de dizer que está na sua posição de sempre, a “direita social”: é atraída pela perspetiva de alcançar o poder alavancada pela extrema direita. O Partido Socialista parece contentar-se em estacionar na dita direita social do PR.  Neste deslizar, não falta quem catalogue de extrema esquerda o Bloco de Esquerda, cujo programa e ação são de socialismo moderado, e atribua o mesmo rótulo ao Partido Comunista, um partido reforçadamente institucional e focado na reclamação, necessária para a democracia, do cumprimento da Constituição da República.

As dinâmicas políticas corrosivas e destruidoras de valores, que a extrema direita prossegue, ameaçam a estabilização da sociedade, a dignidade humana e a democracia. É preciso dar-lhes combate e meter areias na engrenagem desse resvalar geral para a direita, através do exercício da política para além dos ciclos do voto e de um aturado trabalho para reformulação e inovação programáticas em múltiplos campos.

A pandemia, pela surpresa com que emergiu e pelos seus impactos imediatos, provocou forte alerta sobre o valor da vida e do que é indispensável para a nossa subsistência; evidenciou quão importante é a valorização da comunidade e das suas instituições, desde logo o Estado; convocou o bem comum, o humanismo, a cidadania. São valores importantes que têm de manter-se vivos e a que é necessário deitar mão, também para recomposição de estruturas de intermediação.

Os poderes dominantes querem fazer da gestão da pandemia uma oportunidade para executar os seus programas e tolher o futuro. Acelera-se a concentração da riqueza, o domínio de grandes plataformas e grupos empresariais sobre a estrutura da economia. O setor financeiro impõe-se e o Chairman e diretor não-executivo da Goldman Sachs, individuo comprometido com a geopolítica da “economia que mata”, é o presidente da Aliança Global para as Vacinas. Os jovens estão a ser muito sacrificados, mas não há sinais de políticas novas que os venham a beneficiar. As disfunções e ruturas entre gerações estão a crescer, assim como as tensões entre confinados e não confinados, entre teletrabalhadores e trabalhadores presenciais.  Muitos dos que hoje denunciam fragilidades do Estado, clamarão a necessidade de lhe “cortar gorduras” logo que a pressão da pandemia passe. Prossegue a precariedade, a redução de direitos laborais e de salários e surgem novas formas de exploração.

A pandemia evidenciou a centralidade do trabalho e a necessidade de se valorizarem os trabalhadores, todavia intensifica-se a campanha para apoucar o conceito trabalhador e valorizar o de colaborador, como muleta para destruir compromissos coletivos de direitos/deveres no trabalho. O enfoque em determinismos tecnológicos serve de pressão para tornar elemento determinante da “normalidade do futuro” as mediações entre o humano e o não humano. Imaginemos o que seria a regulação jurídico-económica, a das relações entre o económico e social ou a das relações laborais que adaptassem o homem á máquina.

Na política para além do voto tem de estar uma agenda laboral e sindical ofensiva, enquanto eixo fundamental na construção de alternativas à esquerda.


 
 
pessoas
Manuel Carvalho da Silva



 
temas
pandemia    economia    trabalho    política