Os portugueses são demasiados condescendentes e até indiferentes face à pobreza, fator que condiciona o nosso desenvolvimento.
Quando se fala de pobreza em Portugal a nossa mente conduz-nos, de forma automática, para a observação das condições de vida dos idosos, segmento da população que merece toda a atenção, dado as suas potenciais vulnerabilidades e o isolamento em que uma parte deles se encontra. Mas, o maior número de pobres e de pessoas em risco de pobreza são crianças, são cidadãos ativos no desemprego e trabalhadores com salários muito baixos.
Na definição e aplicação de políticas públicas relativas à pobreza, o foco tem sido colocado na busca de soluções para a reparação das suas consequências, por forma a apaziguar as consciências, e muito pouco no combate efetivo às suas causas. Até atores políticos que rechaçam sem hesitações a pobreza têm, por vezes, uma intervenção enviesada, por exemplo, nas propostas que fazem em sede de Orçamento de Estado ou na definição de centralidades das suas agendas políticas. Este cenário, associado a questões culturais inculcadas na nossa sociedade e a caraterísticas de muitos atores sociais coletivos que atuam na área da proteção social, gera bloqueios crónicos e torna normal admitir-se que possa haver imensas pessoas dependentes da benevolência alheia, sem direito a plena cidadania.
Incomodemo-nos com a pobreza de forma positiva, ou seja, para a combater. Tomemos consciência de que Portugal dispõe da riqueza suficiente para diminuir e eliminar este flagelo. Não será fácil fazê-lo. As velhas causas subsistem sem as necessárias respostas e o nosso empobrecimento como nação e como povo acentua-se em vários aspetos: somos um país em rápido envelhecimento; mantemos uma grande emigração de jovens; não se está a garantir condições dignas de vida e de inclusão a boa parte dos imigrantes; as desigualdades no plano territorial não param de se acentuar.
As crianças são pobres quando as suas famílias também o são. As causas dessa pobreza são a falta de trabalho, a existência de baixos salários, a precariedade, os elevados custos da habitação, a inexistência de serviços de creches com preços acessíveis, as dificuldades destas famílias em ultrapassar barreiras no acesso a serviços fundamentais.
Na próxima terça feira, dia 3, será apresentado em Lisboa um Relatório sobre a pobreza em Portugal, da responsabilidade da Cáritas Portuguesa e da Cáritas Europa, que contém cinco significativas recomendações. A ação destes importantes atores está vocacionada para práticas de solidariedade centrada na proteção aos atingidos pela pobreza, mas a sua experiência e observação pode permitir-lhes delinear estratégias que alertem mais para o combate às causas e ajudem à necessária mobilização social e política de que tanto precisamos.
Aproveite-se a oportunidade também para refletir sobre algumas experimentações de ideias inovadoras para o desenvolvimento da ação social que vêm sendo impulsionadas e financiadas pela União Europeia, lembrando três coisas: a ação social será precisa muito para além da duração desse financiamento; ela jamais pode ser um produto de mercado; as formas de financiamento público nacional poderão ter necessidade de ajustes por particularidades locais e por outras exigências de capacitação.