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20-07-2019        Jornal de Notícias

As recentes razões evocadas pelo Partido Socialista (PS) para a rejeição das alterações da legislação laboral, nomeadamente em relação ao trabalho por turnos, são representativas da forma instrumental como este partido e o seu  governo encaram a Concertação Social. Medidas que seriam um passo no combate ao desgaste e efeitos nefastos na saúde causados pela irregularidade dos horários de trabalho desses trabalhadores, mereceram o voto desfavorável do PS, implicitamente por não terem sido apresentados à Concertação Social. Que sentido faz um governo prescindir de proteger trabalhadores em situações de fragilidade porque a legislação proposta não passou nesse órgão? Se esse é o real entrave, por que motivo não colocou o Executivo o trabalho por turnos e outras matérias altamente sensíveis - há muito colocadas na AR pelos partidos à sua esquerda que lhe dão apoio parlamentar - na agenda da Concertação Social ao longo da legislatura? O argumento não tem sustentação.

Vários conceituados constitucionalistas, juristas do trabalho, investigadores e académicos de várias formações, grande parte dos atores sociais (sindicais e patronais) que participaram na Concertação Social e ex-governantes da área do trabalho reconhecem que esse importante órgão de consulta e concertação tem, desde a sua génese, entorses concetuais, estruturais e orgânicas e que, muitas vezes, foi instrumentalizado por governos. Além disso, funciona com uma representatividade imposta, sem qualquer aferição inicial e ao longo dos 35 anos da sua existência, por motivos políticos. A Concertação Social nunca foi, mas hoje está ainda mais longe de ser, um espelho fidedigno das relações laborais em Portugal.

O 1º Ministro António Costa sabe muito bem que a situação é essa. Veja-se o que afirmou ao “Público” a 7 de dezembro de 2015: “Tal como não temos uma visão limitada do diálogo político ao «arco da governação», também não temos o diálogo social limitado às confederações patronais mais uma confederação sindical”, ideia reforçada noutras respostas, rematando a análise do tema dizendo, “ninguém queira transformar a concertação social numa Câmara Alta com poder de veto sobre as decisões da AR”.   

O PS explora a necessidade de submissão das reformas laborais à Concertação Social - a instituição mais pensada na lógica do velho arco da governação - como modo de travar reformas de sentido mais progressista. O PS raramente afirma discordar das reformas laborais que vota desfavoravelmente. Diz apenas que os parceiros sociais ainda não se pronunciaram ou se pronunciaram desfavoravelmente. Ao refugiar-se na posição dos parceiros sociais, protege-se da posição insustentável que seria assumir, abertamente perante a sua base, a rejeição de direitos fundamentais na área laboral.

Com este comportamento, o Partido Socialista diz aos portugueses que nunca será possível fazer reformas laborais de sentido progressista em Portugal, mesmo que a maioria da população tenha transmitido um sinal implícito nesse sentido através do seu voto. Submeter todas as reformas laborais à Concertação Social é assegurar que só há dois caminhos possíveis: ou a estabilização dos desequilíbrios, como agora fez, ou o aprofundamento desses desequilíbrios. As duas opções, conforme as conjunturas, agradam a Bruxelas, à Direita e a todos os que, apesar de declarações bondosas, apostam nos baixos salários, na precariedade, na diminuição e descaraterização da negociação coletiva, na colocação de toda a instabilidade no lado dos trabalhadores como as determinantes para o sucesso do “mercado de trabalho”. A recente afirmação de António Costa à “Visão” (11/07), “assumimos, perante o Presidente Cavaco Silva, que respeitaríamos os compromissos conseguidos em concertação social”, confirma por que lado ele optou nesta revisão de leis laborais.

Não teremos mudança qualitativa da nossa matriz de desenvolvimento com o Governo aliado à elite empresarial mais conservadora - que continua a dominar a economia e o emprego – e a não capacitar e valorizar os trabalhadores da Administração Pública, mesmo que faça muitos discursos apelativos e qualitativos aos setores mais inovadores.

Coloque-se o tema da Concertação Social e o do trabalho, em força, no debate eleitoral.


 
 
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Manuel Carvalho da Silva



 
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