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02-09-2010        Público

Entrámos no mês de Setembro, a escassos quatro meses da eleição presidencial. O homem que "nunca se engana e raramente tem dúvidas";, também já não terá dúvidas (se é que algum dia as teve) de que é o candidato da direita. Dos quatro candidatos no terreno há um que pode projectar sobre si os holofotes sem precisar de se afirmar como tal. Cavaco Silva (CS) cultiva a imagem que mais votos pode render: a de um "Presidente-pai"; protector, ponderado, discreto e responsável, que não se quer "sujar"; na lama da política. Se pudesse, talvez acabasse com as campanhas. Ou seja, como qualquer chefe conservador ou tecnocrata, faz política contra a política. O debate de ideias, supostamente essencial em democracia, dá lugar ao monólogo, às frases vazias e banais, ditas com o habitual ar sisudo ou emolduradas pelo sorriso amarelo a que obriga a pré-campanha.

Este candidato está em vantagem perante os outros, em particular o seu principal rival, Manuel Alegre (MA), que se debate com um conjunto de dificuldades e obstáculos, transponíveis, mas que é preciso encarar de frente.

Concretamente, MA é vitima do dilema em que se encontra. Apresenta-se como o principal candidato da esquerda, apoiado pelo Bloco de Esquerda (BE) e pelo Partido Socialista (PS), mas não deixa de surgir "colado"; sobretudo a este último (o seu partido), que é também o partido do poder e cujo Governo e primeiro-ministro está profundamente desgastado.

É claro que MA não pode ser confundido com a política do governo Sócrates, antes pelo contrário, e o passado recente prova-o. Por um lado, a ligação ao PS e, por outro, o apoio do BE, ilustram o amplo leque de simpatias que suscita, da extrema-esquerda (BE) ao centro-esquerda (PS). Porém, embora isso seja verdade, em tese, as divisões existentes no campo da esquerda e as pressões e jogos políticos subjacentes aos referidos apoios partidários geram lógicas perversas que (objectivamente) favorecem Cavaco.

O BE, que foi o primeiro partido apoiante do candidato, tentou desde sempre reverter em seu benefício as hesitações do PS, condicionando a sua acção e abrindo o campo à resistência interna de muitos socialistas no apoio a MA. A pressa do apoio do BE a Alegre ajudou a protelar o apoio do PS, mas, uma vez confirmado esse apoio, não se assistiu propriamente a uma mobilização das hostes socialistas em favor do seu dirigente "histórico";. Pelo contrário, instalou-se uma espécie de jogo silencioso entre os dois partidos apoiantes (de facto "rivais";). Isto fez com que, em vez de se reforçar e ampliar a mobilização dos militantes de ambos os lados, como seria desejável, neutralizou o antigo MIC (ou impediu o seu ressurgimento) e contribuiu para alguma paralisia organizativa.

Pode dizer-se que o excesso de activismo do BE é a contraparte do défice de activismo do PS, mas não sabemos se o inverso será verdadeiro. O que se sabe é que em matéria de activismo o BE bate o PS aos pontos. Mário Soares condicionou a mobilização do partido? O apoio foi dado a contragosto? A maioria dos dirigentes e quadros socialistas não se empenhou (ainda) na campanha? Os ressentimentos de há cinco anos não foram resolvidos? O PS prefere, de facto, Cavaco na Presidência? O aparelho do partido e os seus pequenos (ou grandes) oligarcas resistem ao apelo participativo do discurso de Alegre?  

Perguntas legítimas, cujas respostas se podem intuir, mas não provar. O certo é que a falta de empenho de dirigentes e militantes socialistas deverá constituir uma preocupação da candidatura de MA, já que isso pode hipotecar a possibilidade de uma segunda volta e a consequente derrota de Cavaco e da direita.

Neste quadro, mais do que negociar equilíbrios ou "compromissos"; impossíveis entre PS e BE, o melhor que MA tem a fazer é reforçar o seu discurso crítico e o seu estatuto independente. Alegre é, e terá de continuar a ser uma voz da esquerda, na linha da tradição social-democrata, da esquerda plural, republicana, europeia, crítica dos excessos do capitalismo global, defensora do Estado social e da Constituição, mas também da modernização do país, do emprego e das políticas sociais, etc. Acresce que, à semelhança do Bloco, a direcção do PS terá de saber pôr em marcha a sua máquina partidária, sem o que será cúmplice de uma eventual vitória de Cavaco e de um reforço do bloco de direita no futuro próximo.  


 
 
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Elísio Estanque



 
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