O Porto tem 215.000 habitantes, Brasília chega aos 2.500.000 e Xangai atinge os 24.000.000. Todas partilham a designação de cidade, com contextos e características bem diferentes, mas também com qualidades e problemas muito semelhantes.
A densidade urbana não é só o número de pessoas por quilómetro quadrado. Aliás os números surpreendem porque os quarteirões do Porto são imbatíveis, ao acolher 5.240 habitantes por km2. De facto, Xangai não tem mais de 3.785 habitantes por km2, apesar do seu espaço urbano verticalizado em torres de habitação e escritórios, e Brasília tem apenas 462 habitantes por km2, devido à estrutura moderna da cidade, com amplos espaços verdes.
Assim, a densidade revela-se também pelo confronto entre o construído e o vazio. Ou seja, entre a cidade de quarteirões, construída casa a casa pela sociedade burguesa portuense; a cidade de blocos horizontais de Brasília, onde a área aberta lhe confere densidade através de um espaço público que representa também o carácter institucional da capital usado pelas pessoas, mas principalmente pelo automóvel; e ainda a cidade de Xangai construída com torres sucessivas que disputam o protagonismo de cada empreendimento, de cada empresa.
Podemos identificar dois temas transversais a todas estas três cidades que permitem enquadrar os principais desafios que enfrentam as cidades.
Um aspeto transversal é uma forte consciência ambiental que permite reforçar a qualidade da paisagem urbana e o bem-estar do cidadão. As cidades estão a alinhar-se com os 17 objetivos para o desenvolvimento sustentável (SDGs) propostos pelas Nações Unidas, que percorrem questões sociais, como a pobreza, o bem-estar, a educação ou a igualdade, e as questões ambientais, como a qualidade da água, o acesso à energia ou a resiliência às alterações climáticas. Assim, o planeamento urbano, a arquitetura e o desenho do espaço público integram um conjunto de soluções ambientais que já não se reduzem a elementos naturais, mas a soluções que resolvem problemas de retenção de águas pluviais, redução do efeito térmico nos edifícios, ou a integração de atividades de economia solidária, como as bem-sucedidas hortas urbanas. São soluções baseadas na natureza (NBS) que não atuam apenas de forma isolada, mas integradas nos processos de regeneração urbana, arquitetónica e paisagística. O principal alvo destes processos é o espaço público, que nos últimos anos tem vindo a qualificar as áreas abertas das nossas cidades para o lazer, para o turismo, mas também para o dia-a-dia dos cidadãos. Uma das ações mais relevantes é a intervenção em linhas de água, ribeiras, lagos, rios, ou mar, procurando despoluir a água para regenerar a sua dimensão paisagística, promover a biodiversidade e aproximar a cidade e os cidadãos da água. A despoluição das ribeiras do Porto, do rio Suzhou em Xangai, ou da lagoa da Paranoá em Brasília, permitiu transformar áreas urbanas degradadas e qualificar o espaço público.
Um outro tema transversal às cidades é a consciência cultural que densifica a vida urbana valorizando o património material e imaterial. As cidades não abandonam o museu tradicional, mas constituem-se cada vez mais como museus ao ar livre para o cidadão e para o turista. Esta dimensão promove a valorização dos conjuntos arquitetónicos e paisagísticos pela sua capacidade de refletir a história urbana e a identidade das instituições, da cidade e do país. Assistimos assim, à intervenção do Estado e dos privados na qualificação do espaço construído, conscientes do valor económico dos imóveis e dos espaços reabilitados. No centro das cidades, a reabilitação de edifícios, que valorizam o carácter histórico dos espaços construídos e a sua capacidade de transmitir a identidade de uma comunidade, está associada à expansão crescente do turismo. No Porto, requalifica-se a cidade do século 19 para alojar os turistas; em Xangai, reabilita-se a cidade cosmopolita do século 20 para instalar empresas e o comércio de luxo e em Brasília, preserva-se o plano piloto como símbolo do progresso e identidade do país. Com prioridades e com métodos de intervenção distintos, as políticas de reabilitação preocupam-se mais em consolidar as estruturas existentes dos centros e não valorizam as áreas periféricas onde habita grande parte da população. Nestas áreas, são muitas vezes as iniciativas da população ou de instituições mais flexíveis, que exploram outros modelos de ativação da cidade, com os denominados livinglabs; laboratórios vivos de experimentação que atuam onde o Estado não consegue chegar.
A cidade é, cada vez mais, um espaço com desafios complexos, mas cujas dimensões ambiental e cultural devem permanecer como fatores de equilíbrio para o bem-estar daqueles que a habitam todos os dias ou pontualmente, quando a ocupam para o trabalho ou o lazer. Assim, é importante valorizar esta densidade, construída e não construída, que ocupa a cidade, tornando-a num espaço mais vivo.