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13-06-2006        Diário Económico
Quando tanto se fala em inovação, importará ter presente que a inovação organizacional constituiu um vector central da inovação.

A COTEC realizou o seu terceiro encontro anual em 15 de Maio último. O tema de reflexão era inovar mais e melhor. Dois dos oradores convidados eram bastante conhecidos nos meios empresariais e académicos: Bengt-Ake Lundvall e Gary Hamel. O primeiro, ex-director da Divisão de Ciência, Tecnologia e Indústria da OCDE e professor na Universidade de Aalborg, na Dinamarca, falou sobre inovação na economia baseada no conhecimento. O segundo, fundador e director da empresa de consultoria ‘Strategos’ e professor visitante da London Business School, focalizou a sua palestra no conceito de resiliência, isto é, na capacidade de as empresas mudarem tão rápido como a própria mudança. Este tema, anteriormente desenvolvido em conjunto com Liisa Valikängas, está, aliás, também presente no artigo de Hamel publicado na "Harvard Business Review" de Fevereiro deste ano – o porquê, o quê e o como da inovação na gestão.

Conhecendo a trajectória dos dois oradores – por exemplo, no que se refere às respectivas visões da cooperação inter-empresarial – esperava duas palestras vivas, interessantes e significativamente distintas. Parte da minha expectativa cumpriu-se: as palestras foram vivas e interessantes. Mas não na totalidade: as mensagens de Lundvall e de Hamel foram claramente convergentes. Em termos sintéticos, a ideia comum pode exprimir-se em duas frases: (1) no quadro económico actual as capacidades de gestão do conhecimento e da mudança são essenciais; e (2) para assegurar tais capacidades importa introduzir mais democracia nas empresas. Dito de outro modo: as empresas com uma gestão centralizada, onde os processos de aprendizagem estão concentrados no grupo de topo e não disseminados no seio da organização serão cada vez menos capazes de conseguir uma competitividade sustentada.

Ambas as exposições me fizeram recordar a ideia de Bruce Kogut e Udo Zander segundo a qual a empresa é, na sua essência, uma comunidade social. Como Arie de Geus, ex-director da Shell, mostrou no livro apaixonante chamado "The Living Company", a sustentabilidade temporal das empresas está associada à sua capacidade de adaptação. E esta depende da identidade organizacional e da dinâmica da abertura ao exterior. Para serem sustentáveis, as empresas têm de estabelecer uma mescla adequada de ‘exploiting’ e de ‘exploring’. Isto é, devem ter a capacidade de explorar as competências existentes (’exploiting’), mas também de desenvolver novas competências (’exploring’).

Neste último caso exige-se uma sensibilidade aos sinais – frequentemente sinais fracos – provenientes do exterior. A capacidade de captar esses sinais não está no topo da organização. Os gestores de topo estão frequentemente demasiado ocupados com os negócios correntes para valorizarem os sinais do futuro. E também, por vezes, demasiado longe do terreno, do mercado, para percepcionarem tais sinais. Quem está junto do cliente está com melhores condições para os identificar. E para ver como os concorrentes estão a reagir. Consequentemente, a capacidade de antecipar a mudança passa pela valorização dos recursos humanos da empresa no seu conjunto. Quanto mais este estiver (ou se pretenda) centralizado, menor a capacidade de resposta a um ambiente em mudança constante.

Neste quadro, é preocupante o resultado apontado por Lundvall de que Portugal é um dos países onde a desigualdade nas oportunidades de aprendizagem, entre os gestores e os restantes empregados, é mais acentuada. Não se trata basicamente de um problema de formação profissional. É uma questão bem mais profunda – de concepção da empresa e de organização das relações internas e externas.

Quando tanto se fala em inovação, importará ter presente que a inovação organizacional constituiu um vector central da inovação. Os desafios defrontados reclamam a mobilização de toda a comunidade que é a empresa. Centralizar o conhecimento (e o poder) compromete a sua sustentabilidade. O reforço da competitividade das empresas portuguesas passa também em larga medida por aqui – por uma gestão mais aberta e por uma efectiva mobilização das capacidades do conjunto dos membros da organização. O que exige necessariamente uma maior responsabilização de todos.