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19-07-2006        Diário Económico
As "águas" com sabor são meras ‘soft drinks’ camufladas cujo consumo sistemático pode ser adverso à saúde.

1. Uma das melhores gratificações de escrever artigos na imprensa é saber que as ideias defendidas e os factos destacados merecem resposta. Por isso é com prazer que vejo um gestor do sector da distribuição, o dr. Luís Vilariça, a levar a sua inquietação crítica às páginas deste jornal ("À prova de água", 12 de Julho).

Este comentário não colocará água na fervura. Mantêm-se as razões para defender o que já defendi: as "águas" aromatizadas criaram um espaço fictício na cabeça dos consumidores. Diga-se, aliás, que a ideia é uma cópia de uma tendência em voga nos EUA há vários anos. Em Portugal as pseudo-águas abriram um novo e lucrativo território perceptivo. A recente entrada da 7Up na corrida ao ouro apenas reforça esta leitura: as "águas" com sabor são meras "soft drinks" camufladas cujo consumo sistemático pode ser adverso à saúde, como um estudo recente da Deco já revelou, efeitos que atingem sobretudo os consumidores mais desempossados de informação e as crianças.

Que estas marcas usem as suas águas de nascente no contexto de fórmulas já usadas por refrigerantes normais (açucares e aditivos sintéticos) pode implicar uma diferença concreta, mas trivial, no nexo de atributos que caracteriza esta "nova" classe de produtos. Nada é claro no mundo do marketing. Há dois anos a Coca-Cola lançou uma pseudo-água chamada "Dasani". O produto foi ridicularizado nos media como "água reciclada". Estas bebidas aditivadas continuam a ser um ‘mix’ de elementos a que sempre se convencionou chamar "refrigerante" ou "gasosa". As pseudo-águas são "refrigerantes reciclados".

As pseudo-águas animaram o mercado das bebidas leves, sim, mas fizeram-no da pior maneira. Muitos argumentos podem passar por debaixo da ponte, mas é necessário dar os nomes certos às coisas. E se os fabricantes não são por si próprios capazes de se deixarem de aproveitar de ambiguidades enganadoras, então o regulador tem de agir. Isso é que é transparente como água.

Nota breve 1: Os governos nunca souberam bem o que fazer com a infra-estrutura dos laboratórios públicos. Exemplo recente foi a inconsequente integração do Instituto Geológico e Mineiro no INETI. Ainda muito falta saber sobre as origens e percursos destas instituições, mas o caso do INETI é um trágico exemplo de uma indefinição que já vem desde o tempo do dr. Salazar. Uma exploração histórica preliminar realizada pela dra. Anabela Escobar em colaboração com o eng. Magalhães Ramalho (fica aqui o agradecimento pelo acesso ao estudo), mostra quão problemático foi o lançamento em 1959 e a manutenção do então Instituto Nacional de Investigação Industrial, o qual daria origem ao INETI. O eng. Ferreira Dias, com a conivência de um presidente do Conselho muito temeroso dos conceitos de aprendizagem, não via grande interesse no aperfeiçoamento das competências de um tecido empresarial fragmentado e desqualificado.

Mas, e apesar dos esforços do INETI (a organização portuguesa que mais patenteou nova tecnologia nos últimos 25 anos), é isto que sempre tem faltado: investigação industrial. Os laboratórios devem abrir-se ao país, é certo, mas historicamente o sistema privado nunca puxou pela investigação. Na consulta pública agora aberta as empresas devem dizer como podem ser mais pro-activas.

E será igualmente útil saber o que pensam os investigadores e o pessoal auxiliar dos laboratórios. Embora raramente sejam ouvidos sobre questões estratégicas, muitas vezes os casos de sucesso de empreendedorismo público em Portugal devem-se precisamente a eles.

Nota breve 2: Mereceu alguma atenção em Portugal um estudo de um grupo de investigação inglês sobre a contabilidade da felicidade (Público 16/7/06). O problema não está em medir a felicidade, isso até pode ser tentado com inteligência e habilidade analítica. Mas qual a credibilidade metodológica de um índice que coloca países como a Colômbia ou o Panamá (com todo o respeito por estes países) no top 5, acima da Noruega ou do Butão por exemplo? ... Nem todos os estudos quantitativos contam. Muitos destes estudos têm como principal objectivo o ‘sound bite’ e a auto-promoção de ‘think tanks’ junto dos seus financiadores. Hoje há ‘rankings’ para todos os gostos.

 
 
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