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16-08-2006        Diário Económico
Em cada 1000 novos estabelecimentos criados em Portugal, apenas um pertence aos Sectores Industriais de Alta Intensidade Tecnológica.

Boa parte da discussão sobre os desempenhos económicos em Portugal tem-se centrado em variáveis de natureza conjuntural e nos seus efeitos de curto prazo. A inflação, a evolução dos salários ou o saldo das contas públicas, são alguns dos fenómenos tipicamente analisados nesta perspectiva conjuntural. A desaceleração do crescimento verificada nos últimos anos, por exemplo, tem quase sempre sido analisada nesta óptica do curto prazo. Olha-se para os fracos resultados como sendo responsabilidade exclusiva da (maior ou menor) habilidade dos governos em gerir as expectativas conjunturais dos agentes económicos. Ora, não sendo tal inferência totalmente incorrecta, o que é um facto é que a evolução económica de médio prazo, e em particular o potencial de crescimento sustentável, dependem fundamentalmente de aspectos de natureza estrutural. Entre esses aspectos evidenciam-se a composição sectorial da economia, o perfil de especialização internacional, o posicionamento das empresas nas respectivas cadeias de valor ou as normas e procedimentos, historicamente herdados, que governam as relações e os comportamentos dos agentes económicos.

Neste contexto de desinteresse pelos aspectos estruturais, valerá a pena dar a conhecer alguns resultados de uma dissertação de Mestrado recentemente defendida por Ana Teresa Barreiros no ISEG, em que são precisamente analisados dados relativos à evolução da composição sectorial da economia portuguesa. Esse trabalho utiliza informações fornecidas pelos serviços estatísticos da Segurança Social, concentrando-se especificamente nos designados Serviços Intensivos em Conhecimento. Com referência a estes sectores, demonstra-se que entre 1991 e 2002 o respectivo emprego cresceu a uma taxa de 6,3% ao ano, aumentando de 180 para 352 mil, enquanto que o número total de estabelecimentos mais que triplicou, de cerca de 10 mil para mais de 33 mil. Esta evolução levou a que em 2002 os Serviços Intensivos em Conhecimento fossem responsáveis por quase 20% das vendas do sector privado português.

Trata-se sem dúvida de uma evolução notável. Este tipo de sectores – que incluem os Serviços de Telecomunicações, os Serviços Financeiros, a Consultoria em Gestão e Marketing, os Serviços de Consultoria em I&D ou os Serviços Ambientais – têm uma enorme importância por possibilitarem a disseminação de recursos críticos pelo conjunto da economia. Em geral, eles produzem também mais VAB por trabalhador que a maioria das restantes actividades económicas. Este facto era atestado pela possibilidade de remunerar os seus trabalhadores, em 2002, com salários 90% mais elevados que a média de todo o sector privado.

Na mesma dissertação o crescimento dos Serviços Intensivos em Conhecimento é cartografado em termos concelhios. Pelos dados apresentados é perceptível que Lisboa concentra 39,1% do emprego, seguindo-se naturalmente o Porto, com 10,5%. Contudo, a grande surpresa vem de Oeiras, com 7,1% e em terceiro lugar a nível nacional, depois de um crescimento do emprego nesses sectores a uma taxa de 26% ao ano entre 1991 e 2002. Tal circunstância leva a que Oeiras seja actualmente o concelho português com maiores índices de especialização neste tipo de serviços.

Mudança estrutural desta amplitude não se assistia em Portugal desde os fenómenos de concentração industrial a Sul de Lisboa, entre os anos 40 e a década de 70 do século passado. Contudo, os progressos nos Serviços Intensivos em Conhecimento não nos devem fazer esquecer um outro lado do problema da composição sectorial da economia, que tem a ver com a evolução dos Sectores Industriais de Alta Intensidade Tecnológica. O que nos dizem as estatísticas é que em cada 1000 novos estabelecimentos criados em Portugal, apenas um pertence a esse tipo de sectores. A pergunta que ocorre, nesta circunstância, é se um "crescimento desequilibrado", com uma maior especialização em Serviços Intensivos em Conhecimento e (praticamente) sem indústrias de alta tecnologia, será possível. Neste panorama não deixa também de ser inquietante a recentemente anunciada extinção do Instituto Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial.


 
 
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