Centro de Estudos Sociais
sala de imprensa do CES
RSS Canal CES
twitter CES
facebook CES
youtube CES
21-01-2018        Jornal de Notícias

Esta semana reúnem-se, em Davos, a elite económica e financeira mundial e os líderes políticos de mais de 60 países. Este ano lá estará Donald Trump com o seu executivo. Esta elite internacional mais globalista não se sente incomodada com as políticas xenófobas, racistas e belicistas, ou com as reformas que Trump vai impondo e das quais resultam mais perigos para a humanidade e mais injustiças e desigualdades na sociedade norte americana. Contudo, parece estranho que acolham Trump tendo presente a sua retórica (não passa disso) protecionista.
Após um ano de governação deste ser marginal a princípios éticos, morais e universalistas, o que se constata é mais desregulação financeira, ambiental e social, culminando recentemente na enorme redução de impostos aos muito ricos; e isso a maioria das elites internacionais aplaudem. Em Davos, em janeiro de 2018, os que dominam aquela elite internacional vão estar, paradoxalmente, a festejar êxitos de Trump, mesmo que no futuro tenham de entrar na esconjura da criatura. E na festa dos êxitos vão poder juntar ganhos decorrentes das vitórias de Macron em França, de Merkel na Alemanha e da viragem política em curso na América Latina. É doloroso mas é verdade, em Davos, a plutocracia global tem razões para celebrar.

No início deste século, surgiu em Porto Alegre, no Brasil, o Fórum Social Mundial que procurava ser um contraponto à globalização de Davos. Os Fóruns aí realizados entre 2001 e 2004 foram importantes reuniões de pensadores e atores políticos que afirmavam a não submissão e, acima de tudo, de movimentos sociais de todo o mundo dispostos a agirem na construção de alternativas. Fruto de uma nova conjuntura política, económica/financeira e tecnológica neoliberal e também, em parte, como efeito da afirmação de um globalismo de esquerda no qual se depositavam excessivas expectativas, estes Fóruns foram perdendo fulgor. O grau de homogeneidade, de mobilidade e de organização e afirmação de poder que o capital estrutura e faz funcionar à escala global, dificilmente será alcançado pelos trabalhadores ou pelos deserdados. Os programas políticos e as formas de agir que estes têm de construir para atingirem os seus objectivos de vida digna exigem princípios e valores contra a exploração, exigem respostas onde as pessoas se encontram, alianças nacionais e supranacionais que ponderem os diferentes interesses. As respostas ao globalismo de Davos são uma construção possível e necessária, mas estão muito dependentes de contextos concretos e da sua gestão política.
Porto Alegre será também esta semana foco de atenção internacional. Será na cidade dos Fóruns Sociais Mundiais – que deram um impulso decisivo para a eleição de Lula da Silva e tiraram da pobreza dezenas de milhões de brasileiros – que ocorrerá no dia 24 de janeiro um ato do “julgamento” do ex-presidente brasileiro. O que está em causa não é o processo judicial em si mesmo, mas sim a possibilidade de Lula se poder candidatar às eleições deste ano, o que colocaria em risco a mudança política reaccionária em curso desde o afastamento de Dilma.

Dilma Rousseff, que não foi acusada de corrupção, foi afastada por manobras de corruptos e indivíduos sem escrúpulos como Temer (tem hoje o apoio de 3% do povo brasileiro), num processo em que uma parte da justiça foi, e é, ator político do golpe. Com a chegada de Temer ao poder, assiste-se a uma devastação política, económica e social em que a economia fica cada vez mais na posse de oligarcas brasileiros e de grandes grupos internacionais, os direitos do trabalho são cilindrados e o sistema de segurança social é desmantelado, desprotegendo ainda mais o comum dos trabalhadores e os mais pobres.

Joga-se em Porto Alegre um fator muito importante para a direção de um processo político de viragem neoliberal que pode encontrar a quase plenitude até ao fim deste ano na América Latina, já que, além do Brasil, anunciam-se eleições no México, na Venezuela e no Paraguai. Há que tudo fazer para que este ano político no Brasil seja fonte de esperança, como já foi no início do século. Será bom que as elites de Davos daqui a um ano não tenham mais Trump para convidar.


 
 
pessoas
Manuel Carvalho da Silva



 
ligações
Observatório sobre Crises e Alternativas