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01-03-2006        Diário Económico

O que é que cria economias de aglomeração e de rede e consolida resultados na materialidade concreta que o país é?

O Governo aprovou recentemente a Resolução que configura o Quadro de Referência Estratégico Nacional 2007-2013. Trata-se de planear a médio prazo investimentos estruturais que qualifiquem o país, em articulação com a política europeia de coesão. Parece assente que a estratégia estabelecida para este ciclo de políticas públicas se concretiza em apenas três Programas Operacionais (PO) nacionais, ditos "temáticos": factores de competitividade, potencial humano e infra-estruturação do território. Somam-se os PO para as Regiões Autónomas e as cinco NUTS II do Continente.

O primeiro aspecto a sublinhar é o da concentração temática. As prioridades não parecem mal identificadas e os problemas estruturais são os conhecidos. Claro que ainda falta saber que estragos causam as rivalidades entre ministros e a propensão para se ser dono de uma gaveta de dinheiro ("qual é o meu dinheiro nos fundos estruturais?"), que poderosos ‘lobbies’ de formação vão continuar a gastar sem mostrar proveitos, como é que a racionalidade "esclarecida" de certas instituições ou o poder de sedução dos patrões das burocracias associativas empresariais vão merecer reverência. Falta saber se tudo isto vale mais do que empresas inovadoras, sectores em transformação rápida, recursos territoriais passíveis de serem ‘clusters’ de qualidade.

Um segundo aspecto – argumento central deste artigo - é o que apela para um exercício de busca de racionalidade substantiva das políticas públicas, para além da estrutura orgânica que as formata. Os problemas essenciais que explicam os êxitos limitados das políticas estruturais em Portugal estão identificados: dispersão dos meios, rendição a lógicas de "clientes", predomínio da vertente distributiva. Inversamente, insiste-se na necessidade de eficiência colectiva, com a criação de externalidades positivas, lógicas de "clusterização" e uma orientação ‘problem-solving’.

Quando os objectivos são estes a pergunta é: o que é que cria economias de aglomeração e de rede e consolida resultados na materialidade concreta que o país é? As respostas são várias. Mas é também aqui que regressa o território – esse elemento matricial da vida colectiva, como o mostram os melhores exemplos, desde Silicon Valley à agora tão celebrada Finlândia, ou à Itália dos distritos industriais marshallianos ou, em geral, aos vários "milagres" nunca previstos por ciências tão ciosas da sua normatividade. Território significa, neste contexto, proximidade, organização, formação de bases de eficiência colectiva para integrar actores e articular cadeias de valor (é o lugar onde o microeconómico se robustece e a dispersão avulsa se contraria). Território são, também, as cidades e os sistemas urbanos.

Portugal só tem cidades pequenas. Mas, com mais de 3/4 da população vivendo a uma escassa distância-tempo dos centros urbanos relevantes, é aqui que se viabiliza o acesso ao bem-estar, à qualificação que capacita, à inovação social e à emulação competitiva (e se contraria a dispersão municipal, a aplicação de recursos sem rumo e o proteccionismo institucional autárquico resultante de uma agenda política pressionante porque não se lhe criaram alternativas). Sistemas regionais de inovação e sistemas urbanos territoriais – quer dizer, os melhores recursos do território – são, assim, dois dos grandes contextos de integração de políticas e de racionalidade que o QREN deveria ousar usar, para além das peias administrativas, dos poderes soturnos e do facilitismo.

E já agora: por que não havemos, ao menos, de almejar um país com cidades bonitas e ordenadas (elas que estão tão feias), mobilidade quotidiana facilitada, pessoas qualificadas em sistemas de aprendizagem e de produção reforçados pela proximidade, ‘clusters’ ágeis, um país globalmente valioso? É pedir muito a um QREN e a sete anos de políticas financiadas por dinheiros europeus? Mas a nossa pressa começa a ser muita e os fundos estruturais têm sido sempre menos de 1/8 do nosso esforço de investimento...


 
 
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José Reis